À exceção dos cientistas e religiosos materialistas(!) radicais, a maioria de nós reconhece, de milhares de formas diferentes, que existem cinco reinos na natureza: o mineral, o vegetal, o animal (ou animália), o hominal e o espiritual, não importando as gradações e formas de classificação. As confusões acerca dessa classificação decorrem mais das distinções nomenclatórias entre as formações de saber organizadas.
 
{“Toda a nossa Ciência, comparada com a realidade, é primitiva e infantil – e, no entanto, é a coisa mais preciosa que temos.” (Albert Einstein)}
 
O reino hominal não é um reino isolado, mas é a intersecção entre o reino animal e o reino espiritual. [E o reino hominal tem dois sub-reinos, a saber: o sub-reino hominal masculino e o sub-reino hominal feminino, em princípio, bastante diferentes entre si, não só física, mas também emocional e psicologicamente.]
Ademais, no reino hominal existem elementos de todos os outros reinos, variando apenas a consistência da matéria-prima formadora.
Para efeito de mera terminologia, convencionou-se chamar mais comumente de “espírito” a unidade energética inteligente e autoconsciente, e de “alma”, essa mesma unidade enquanto vivificante de um corpo físico (ou encarnada). Lembremos que alma (“anima”) e animal têm parentesco etimológico latino (“animae”). É uma mera questão lexical dentro das principais vertentes espiritualistas ocidentais.
Em sua obra-prima “Assim falou Zaratustra”, Nietzsche concluiu que “o homem é uma corda esticada entre o animal e o além-homem; uma corda por cima do abismo”. Por isso, a clonagem humana, a partir desse raciocínio, só será possível se esse “além-homem” (ou super-homem, como alguns traduzem o termo alemão “ubermensch”, usado por Nietzsche), exclusivo dos seres humanos, se acoplar ao embrião clonado. Só com isso é que será garantida a vida normal de qualquer pessoa natural. É o que Jesus quis dizer sobre o “nascer do espírito”. Eu pessoalmente, traduziria esse “ubermensch” como “espírito”, “logos”, “quantum”, “unidade divina”, ou até como “sopro divino” (aquele que Deus deu no recém-modelado corpo de Adão, para que este tivesse vida).
Como acabei de mencionar a palavra “Deus”, é necessário um freio de arrumação na linha argumentativa, para não confundirmos os objetivos primordiais defendidos aqui na “boca de cena” destes escritos.
Antes de engrenar a leitura, rogo a Vosmecê, que eu sei que vem de longe, que arrie aí um pouco suas malas ideológicas, para ficar mais leve, mais à vontade. Isso porque este não é um livro de ensaios religiosos. Não tem compromisso com nenhuma religião, seita ou qualquer denominação espiritualista ou evangélica. Mas também não é um livro tipicamente acadêmico. Não tem compromisso com nenhuma instituição de pesquisa, de estudos, de experiências formais ou com resultados estatísticos. E também não tem compromisso com o Deus antropomórfico da versão javista, cultuado e venerado por muitas religiões e formações evangélicas.
 
No reino hominal, toda seleção para preservação dos seres que o representam só tem sentido quando é inclusiva, não exclusiva como entre os animais selvagens.
A teoria da evolução das espécies pela seleção natural, introduzida no livro “A Origem das Espécies”,pelo naturalista britânico Charles Darwin (1809-1882) não atinge a natureza dos seres humanos. [Darwin chegou a definir o homem como “homo pithecus”, ou homem-macaco, em seu livro “A Descendência do Homem” (em algumas edições integrando o próprio “A Origem das Espécies”), mas não deixou prova cabal da sua teoria para nós, seres animaloides-espirituais].
 
{“O ser humano é o bicho que mais se parece com gente!” – Toinho de Goia, escritor e vendedor de cordéis, enquanto assistia a uma empresária política distribuir gratuitamente refrigerantes e panfletos partidários para moradores da comunidade rural de Mombaça, no Município de Serrinha-Ba, dias antes de uma festa de vaquejada, em 1989.}
 
Da mesma forma que, mais amplamente, não há povo como entidade monobloco, não somos meras manadas de “homines pitheci”
[1], homogênea e igualmente ativa e reativa a qualquer ideologia. Nenhum dos mais de seis bilhões dos chamados seres humanos é influenciado apenas por fatores do habitat social ou pessoal em que vive ou viveu.
Além do espaço, cada ser humano é, também, produto do tempo. O espaço são os fatores ambientais, com seus múltiplos estímulos educativos. O tempo são os fatores da experiência, com seus múltiplos estímulos autoeducativos. Mas só nessa comparação podem se inserir os seres humanos na lei da evolução das espécies por uma fria e instintiva seleção natural.
Há outra forma de evolução, não pela seleção dos mais fortes e mais capazes, nem pela maior facilidade de adaptação a novas condições ambientais que sucedem umas às outras na caligem das eras. É uma evolução que se manifesta pela fortificação e capacitação inclusiva dos mais frágeis e menos capazes a novos ambientes de oportunidades e crescimento, em pé de igualdade em relação aos que já são “da casa”. É pensada, agida e principalmente sentida a partir de um gesto a que chamamos de assistência, de solidariedade ou de amor fraternal, a depender da origem do gesto inclusivo. É uma “exclusividade” do reino hominal, não analisada profundamente pelo naturalista materialista Charles Darwin nem por outros evolucionistas zoonaturalistas anteriores ou posteriores a ele. Tal sentimento único é o adjutório aos que precisam de alguma força para disputar em iguais condições com os mais favorecidos pelos fatores ambientais e experienciais, no difícil e nem sempre justo concurso de valores pela sobrevivência.
No nosso reino coexistem dois níveis de forças, sendo uma inclusiva e outra exclusiva. A própria maldade também é justificada por muitos como medida autoinclusiva e defensiva(!).
A força inclusiva e interprotetiva é preponderante e sempre foi maioria na história dos homens (apesar dos jornais nunca lhe darem o mesmo destaque que as notícias vinculadas aos escândalos). Essa força do bem nunca evoluiu segundo ou seguindo os critérios das medidas darwinianas, mas coexiste desde o surgimento dos primeiros seres inteligentes no planeta. Ela não depende das causas ambientais ou históricas das facilidades ou dificuldades do homo amorosus que, no fundo, no fundo, é também cada um de nós (embora em uns essa afetividade esteja bem no fundo mesmo e em outros, à flor da pele). É a força que diferencia, por exemplo, o amor das mães humanas, que normalmente é incondicional, do instinto protetivo das mães do reino exclusivamente animal.
As fêmeas selvagens normalmente abandonam à morte os filhotes recém-nascidos com alguma deficiência que os impedirá de sobreviver. Elas próprias acionam a lei darwiniana da sobrevivência dos mais fortes, sem qualquer remorso. Mas não podemos deixar de citar, por uma “questão de justiça”, aqueles animais que dão exemplos de proteção e amor a seus filhotes, que enternecem aos mais duros dentre os seres humanos.
É certo também que (lá vem o outro lado desmancha-prazeres!) algumas mães humanas, em estado de desequilíbrio mental, emocional ou espiritual, podem fazer atrocidades com seus filhos, que arrepiariam até alguns animais que comem os próprios filhotes recém-nascidos. Mas, isso são aberrações excepcionais. Fogem drasticamente à regra, pelo menos nos povos mais socialmente modernizados. Isso porque ainda há costumes, entre algumas tribos indígenas mais selvagens, de se praticar o infanticídio quando bebês nascem com defeito físico ou mental, ou quando são do sexo feminino já tendo irmãs anteriores, ou quando são gêmeas, além de outras discriminações. Normalmente, quem mata diretamente não é a própria mãe, que sofre muito com essa ação primitiva da tradição tribal. Hodiernamente, segundo alguns estudos, muitas delas brigam e conseguem permissão para criar seus filhos, de qualquer jeito.
 
Normalmente, entre os humanos existe uma espécie de seleção, mas não natural, ou seja, não meramente zooinstintiva. Os humanos não vivem em bandos ou manadas com características comportamentais homogêneas. Cada ser humano é um indivíduo único, por mais que eventualmente esteja sob cabrestos despersonalizantes do sistema e seus múltiplos ferrões, por mais que tenha entranhados em sua alma os caracteres ambientais da sua cultura e da sua origem sociofamiliar.
A seleção por melhores condições de vida e pela ocupação dos melhores nichos sociais é multifatorial, com ênfase na atitude que cada um se autoimpõe para subir ou para descer da camada evolucional em que se encontra. Também chegam bem próximos como fatores fortemente presentes o ambiente (inclusive o corporal fisioquímico) e a história passada ou futura de cada um. Entendamos como história futura o conjunto das expectativas, dos sonhos e das esperanças de uma pessoa. Quando isso se transforma em medidas práticas de planejamento, já se constrói alterativamente o futuro no presente, mesmo que aquele não seja exatamente o que pretende o sonhador-planejador.
E, diferentemente dos animais excluídos pela seleção natural, normalmente os seres humanos, quando são excluídos ou autoexcluídos de onde se encontram, não morrem necessariamente. Normalmente, caem para uma camada inferior da mesma sociedade em que vivem. Se continuar sem qualquer apoio na queda livre, podem chegar ao nível mais baixo do estamento, qual seja, a sarjeta, mas não necessariamente ao suicídio camicase.
Isso sem contar que, muitos “humaninhos” já nascem excluídos, mesmo sem ter qualquer doença ou fraqueza. E aí sua luta para chegar futuramente a camadas mais conceitualmente dignas do corpo social é mais inglória do que a luta dos peixes ao subirem as cabeceiras dos rios durante a chamada piracema, enfrentando correntezas o tempo todo.
Houve uma época, no século XIX, em que, para piorar a situação, havia um costume, entre “positivistas entendidos”, de se pré-classificar muitos excluídos congênitos como criminosos natos, a partir da análise de seus traços fisionômicos! A ideia era ligar resultados antropométricos ao caráter. Foi primeiro disseminada pelo criminologista italiano Cesare Lombroso (1836-1909), o fundador da Antropologia Criminal, sendo já o desenvolvimento da Frenologia
[2], teoria criada pelo médico alemão Franz Joseph Gall, bem no início do seculo XIX. Felizmente, tais teorias foram vencidas pelas ideias mais humanizantes do século XX (embora haja novas correntes neste início do século XXI pendentes a ressuscitá-las).
No plano individual é sempre possível a superação de quaisquer obstáculos, desde que se tenha liberdade e consciência de escolha. Os peixes da piracema nascem preparados para vencer as correntezas rio acima, e sempre conseguem chegar ao local da desova (ainda que não todos exatamente). Como conseguem? Determinação, persistência e disciplina. Entre os grandes homens da nossa história, conhecemos muitos casos de superação de todos os fatores adversos possíveis, que até pareceram pré-requisitos para melhor prepará-los para suas missões humanitárias fases adiante de sua vida. Um desses exemplos maiores de superação viveu há dois mil anos e nasceu em um tabuleiro onde se servia comida para animais em uma estrebaria. Sua família foi perseguida pelo governo e teve de se refugiar por algum tempo em outro país. Porém, já no fim de sua vida, mesmo relativamente curta, conseguiu atingir seus objetivos, ainda que, como prêmio, tenha ganhado apenas uma coroa de espinhos e uma cruz. Que dureza! Mas conseguiu o mais importante: deixar para a posteridade o maior recado de todos os tempos para se conseguir uma autoinclusão no maior dos mundos, a saber, o mundo de Deus, aqui na Terra mesmo.
 
Quem, pois, não nasceu em ambiente protegido e multiestimulante ao crescimento, mas não deseja ficar para trás na cadeia evolutiva hominal, cuide de reforçar os principais recursos de que pode dispor, para se adaptar a qualquer valência ambiental. No geral, são ótimas ferramentas de luta: dedicação, coragem de arriscar mudanças, atitude e apuro das inteligências naturais de que é portador, especialmente a inteligência social e a inteligência afetiva.
É a chamada “teoria do possibilismo”. É quando se chega à conclusão de que o homem é produto dos seus meios e da sua própria história passada, mas que também é o produtor dos seus meios e da sua própria história futura. Somos também os próprios meios. Tudo é questão de como cada um metaboliza e processa, conceitual e interativamente, os meios e a história dos meios e de si mesmo. Tudo é questão de boa intenção e de intensão de esforços para a luta transformacional a partir dessa consciência de si como meio, como mediado e como mediador.
 
{Cada ser humano é, também, produto inevitável dos vários meios internos com que interage, a exemplo do inconsciente, memórias atávicas, sonhos, traumas, crenças, esperanças, imaginações, conceitos, quimismo cerebral, alimentos, sentimentos e aquela conhecida turma de ideologias. Cada ser humano tem várias personas, que são, em suma, os próprios eus psíquicos, uns mais reprimidos, outros mais expandidos, alternativamente.
Cada eu é uma persona, com suas qualidades inerentes, que influenciam os demais eus. Há personas antagônicas entre si em sua natureza, embora muitas vezes intercomplementares, ao ponto de se projetarem em perfeita harmonia para o convívio social, enquanto se digladiam internamente por causa das diferenças gritantes.
Difícil é se encarar essa diversidade cheio de drogas alienantes, emburrecedoras e ensurdecedoras no juízo sem juízo, patrocinadas pelos capitães da indústria (in)cultural e dessensibilizante. }
 
Principalmente na atual contemporaneidade, em que imperam as tecnociências dos meios de comunicação e em que prodomina a liberdade (relativa) de expressão, passamos a ser frutos de vários meios (familiar, religioso, político, profissional, midiático, cultural, escolar, nutricional...). Isso tudo nos impõe o exercício de vários papéis distintos e ao mesmo tempo intermesclados pelas influências multiambientais, onde, quando e com quem quer que estejamos.
Sempre fomos e seremos frutos das nossas inspirações internas e inconscientes, e das influências e contágio psíquicos externos, mas também de nossas inspirações transcendentais, cujo despertamento depende do mote provocador.
O estro que inspira e motiva muitos artistas a trabalhar provém de objetos, ou melhor, de sujeitos inteligentes voadores não sensorialmente identificados.
Todo mundo também é meio médium de fontes intangíveis pelos sentidos físicos. Não é à toa que a palavra latina “medium” quer dizer meio. E os “meios”, em latim, se traduzem como “media” (plural de “medium”), expressão que, por sua vez, ficou singularizada em inglês. Aqui em português, a expressão inglesa “media”, no sentido tecnológico, virou “mídia”. Deste modo, somos hoje seres “multimídias”. Geramos influências para os vários meios e sofremos influências dos vários meios. Cada um de nós é fruto dos meios e frutifica os meios. Somente existimos porque há uma memória passada que nos moldou e uma memória futura que nos aguarda inexoravelmente para ser moldada. Uma memória carregada de ideias e de ideais, de traumas e de tramas, de sonhos e de senhos, de alegrias e de alegorias. Isso sem contar as aulas da nossa antiga professora de educação moral e cívica. É uma memória temporal, espacial, universal e divina, coletivamente individualizada e individualmente coletivizada.
 


[1] Plural do latim “homo pithecus”, também chamado de “anthropopithĕcus”.
[2]Teoria que reivindica ser capaz de determinar o caráter, características da personalidade, e grau de criminalidade pela forma da cabeça (lendo "caroços ou protuberâncias")”. Fonte: Wikipédia. Gerou no Ocultismo também uma crença chamada “craniomancia”, que é a arte da advinhação de traços de personalidade, a partir do exame do crânio de seu dono.
Josenilton kaj Madragoa
Enviado por Josenilton kaj Madragoa em 17/01/2011
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