Sancho Pança. - Nada é tão ruim que não possa ser piorado.
– Mestre, eu morri?!
– Ainda respira, meu amigo. Mas está em situação deplorável.
– Como tem certeza que não morremos, mestre?
– Não morremos, Sancho. Mas se tivéssemos morrido, teria sido uma boa morte, pois estávamos a serviço da justiça, – disse Quixote cuspindo sangue e areia que se misturavam em sua boca enquanto esforçava-se para sentar-se.
– Que justiça há em lutar contra dez homens – suspirou Sancho.
– A justiça não está nos números, Sancho. Mas nos princípios que estamos defendendo.
– Não há parte em mim que eu não sinta dor, mestre.
– Alegre-se, escudeiro. Lembre-se das palavras de Sêneca: “não há nada que faça sofrer o corpo que não favoreça a alma.”
– Como consegue filosofar numa hora dessa, mestre?
– Filosofia é vida, Sancho, e ajuda a amenizar as dores. Experimente.
– Vou tentar – disse o fiel escudeiro enquanto se arrastava para se apoiar em uma árvore. Disseste outro dia, meu senhor, que a felicidade não está nas coisas externas, mas na contemplação da virtude e da alma.
– Foi bem o que eu disse, meu caro.
– E disse também que estando a felicidade sempre embasada nessas coisas estáveis e internas, ela não poderia nem ser aumentada nem diminuída.
– A surra parece ter favorecido sua memória, Sancho.
– Mas, mestre. Olhe para nós. A julgar por este estado deplorável muito pior do que nos encontrávamos antes da peleia, somos obrigados a constatar que há infelicidades menores e há infelicidades maiores. É bem como diz o ditado: nada é tão ruim que não possa ser piorado.
– Disseste bem, meu escudeiro. De fato, diferente da felicidade, a infelicidade pode ser aumentada ou diminuída, pois ela é própria do homem comum, que põe a consciência no corpo e se mistura com este. O filósofo Plotino bem nos alerta: “não é possível estar em comunidade com o corpo e viver em felicidade.”
– Mais uma vez esse Plotino, mestre. Acaso ele também saberia me dizer como posso estar separado do corpo e ainda estar vivo?
– Venha, Sancho. Sejamos generosos com este recipiente que nos carrega e cuidemos de nossas feridas. Sua pergunta é digna e a busca pela resposta exigira estados físicos mais apropriados.
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Quixote - Felicidade e o Gênio da Lâmpada
Um Quixote à prova de Bullying
Sancho Pança - Eu sou Deus?
Registra-se que apenas tentei dar uma forma mais amigável aos textos de inestimáveis filósofos clássicos.
Poucas dessas ideias são originalmente minhas. Mas como diz os verdadeiros filósofos:
" o maior mérito não está em formular belas ideias, mas em reconhecê-las e ser capaz de vivê-las em alguma medida"
– Mestre, eu morri?!
– Ainda respira, meu amigo. Mas está em situação deplorável.
– Como tem certeza que não morremos, mestre?
– Não morremos, Sancho. Mas se tivéssemos morrido, teria sido uma boa morte, pois estávamos a serviço da justiça, – disse Quixote cuspindo sangue e areia que se misturavam em sua boca enquanto esforçava-se para sentar-se.
– Que justiça há em lutar contra dez homens – suspirou Sancho.
– A justiça não está nos números, Sancho. Mas nos princípios que estamos defendendo.
– Não há parte em mim que eu não sinta dor, mestre.
– Alegre-se, escudeiro. Lembre-se das palavras de Sêneca: “não há nada que faça sofrer o corpo que não favoreça a alma.”
– Como consegue filosofar numa hora dessa, mestre?
– Filosofia é vida, Sancho, e ajuda a amenizar as dores. Experimente.
– Vou tentar – disse o fiel escudeiro enquanto se arrastava para se apoiar em uma árvore. Disseste outro dia, meu senhor, que a felicidade não está nas coisas externas, mas na contemplação da virtude e da alma.
– Foi bem o que eu disse, meu caro.
– E disse também que estando a felicidade sempre embasada nessas coisas estáveis e internas, ela não poderia nem ser aumentada nem diminuída.
– A surra parece ter favorecido sua memória, Sancho.
– Mas, mestre. Olhe para nós. A julgar por este estado deplorável muito pior do que nos encontrávamos antes da peleia, somos obrigados a constatar que há infelicidades menores e há infelicidades maiores. É bem como diz o ditado: nada é tão ruim que não possa ser piorado.
– Disseste bem, meu escudeiro. De fato, diferente da felicidade, a infelicidade pode ser aumentada ou diminuída, pois ela é própria do homem comum, que põe a consciência no corpo e se mistura com este. O filósofo Plotino bem nos alerta: “não é possível estar em comunidade com o corpo e viver em felicidade.”
– Mais uma vez esse Plotino, mestre. Acaso ele também saberia me dizer como posso estar separado do corpo e ainda estar vivo?
– Venha, Sancho. Sejamos generosos com este recipiente que nos carrega e cuidemos de nossas feridas. Sua pergunta é digna e a busca pela resposta exigira estados físicos mais apropriados.
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Sugestão de leitura do resto da saga:
Quixote - Felicidade e o Gênio da Lâmpada
Um Quixote à prova de Bullying
Sancho Pança - Eu sou Deus?
Registra-se que apenas tentei dar uma forma mais amigável aos textos de inestimáveis filósofos clássicos.
Poucas dessas ideias são originalmente minhas. Mas como diz os verdadeiros filósofos:
" o maior mérito não está em formular belas ideias, mas em reconhecê-las e ser capaz de vivê-las em alguma medida"