JORNADA MINEIRA DA CULTURA - PEÇANHA - MG

A história de cada um nunca é a história de cada um, pois não existe o ser uno, desprovido de congraçamentos, de enlaces e encaixes. A graça de um acontecimento só acontece pelo fato de tocar outros, de enredar situações alheias, o que confere a elas situações ímpares, interpretações idem, alcances e significados mais amplos ainda.

A minha história, desta forma, não é a minha história, mas a nossa. Eu não existo sem você, assim como não há você sem mim. Como disse o poeta, um mais um é sempre mais que dois. Como poderia eu me imaginar longe de meus pais, amigos de infância, colegas de escola, amigos virtuais...? Que seria de mim sem meus ídolos, de infância e atuais, sem meus amores sonhados e idealizados, sem as minhas paixões platônicas, enfim, meus amores e dissabores? Quem seria eu sem você?

Huuuummm... vai dizer, colega, que não se lembra de nossas peripécias? De quando subíamos a Bomba de skate, pra depois descermos o Morro do Segredo de bicicleta? Bom demais... Assim como era bom correr pelos corredores do Colégio quando víamos a Naná. Ou mesmo o opala verde-abacate da Dona Julieta, fazendo a curva da rodoviária, em direção ao colégio. Por falar nela, lembra de quando nós colocávamos cascas de mexerica debaixo da carteira dela ou usávamos desodorante barato para que ela não desse aulas? Não dá pra negar, né?

Também me lembro do quanto nós gostávamos do picolé do Chico Zeferino, a salada de vinte e uma frutas da Dona Ambrosina. Sim, tenho certeza de que eram vinte e uma, pois eram exatamente vinte bananas e um mamão. Se a memória não me trai, você me acompanhava no tour que fazíamos pelo shopping, quando entrávamos pela loja do Toca, passávamos pela do Zé Clementino e saíamos na do César Caldeira. De quebra, tirávamos uma foto com o Zé do Messias. Na volta, teimávamos em passar em frente ao casarão assombrado do Adão do Fróis. Hilária foi a noite em que participamos do conjunto do Leonel, Zé Minhoca e os outros...

Pra comemorar tudo isso, bem que a gente podia, amanhã, procurar a Tia Neva e sair outra vez nos caboclinhos, né? Será que vai dar certo? Porque eu me lembro de que eu desfilei pela Bomba e você pela Liberdade! Mas houve uma noite em que fomos ao carnaval no Cavaquinho, eu de pierrot e você de colombina. Nossa! Você se lembra do Monsenhor Amaral? A gente passava em frente à Casa Paroquial quando íamos ao piquenique na Mãe Dágua. No trajeto, havia a casa do Professor Generoso. Que figura, né?

Não dá pra negar que a nossa história é rica. Foram tantas emoções! Como esquecer o fusca azul calcinha do Professor Joaquim Aleixo? Lembra de quando você machucou o dedão do pé e teve que ir pra escola com um pé de kichute e outro de chinelo? Ele não abria mão do uniforme, mesmo nessas situações.

Ai, meu Deus... e aquele tempo em que buscávamos água nas fontes espalhadas pela cidade? Caramba! Lembro também que havia um pé de tibi na descida da Bomba para o Funda, no quintal da Dona Melina. Ela ficava fazendo potes de barro e nós íamos pegar os tibis. Morríamos de medo de seu filho, portador de necessidades especiais, que corria atrás de nós. Nesses momentos, não havia solidariedade, pois era cada qual por si.

Ainda me lembro de nossa tentativa de realizar um voo de asa delta a partir do campo de aviação... imagina só... melhor que isso eram as viagens que a gente fazia pelo Sítio do Pica-pau Amarelo, sem sair da biblioteca do colégio. Concorda?

Você pode até pensar que eu menti, que muitas dessas coisas não aconteceram, que são surreais. Mas fizeram parte de nossos sonhos, de nossos desejos. Assim, também fazem parte de nossa história, que não é construída apenas de realizações, mas também de frustrações e devaneios.

Sabe, tenho saudade de tudo isso. E só reforço a minha opinião que a minha história não existe sem a sua. E que a sua também não existe sem a minha. E você tem noção de quantas outras histórias têm ligação com as nossas? Na verdade, parece mais um tapete, uma corrente... E precisa parar por aqui? Será que não podemos prosseguir? “Vem, amigo, nadar nos rios, vem, amigo, plantar mais lírios, no vale, no mato, e no mundo, vamos brincar...”

É, meu amigo, são tantas as histórias... não paramos pra pensar que, a todo instante, estamos construindo-as. Quando percebemos, já se encontram aí. E não há como reformá-las, retocá-las. Muito menos anulá-las, esquecê-las. Só nos resta reconhecê-las e nos orgulhar delas.

O que você acha de, depois, refazermos aquele cooper, saindo do funda, passando pelas duas cachoeirinhas? À noite, a gente poderia dançar novamente no Quenta Sol ou no Galo de Ouro.

É, nem tudo é mais possível. Dá pra ir novamente à bancada, colocar aquele velho aparelhinho toca-fitas e ficar beliscando algo, bebericando e fazendo mexericos e intrigas. Também podemos ficar no coreto. Ou você vai dizer que não se lembra do footing... Ok. Pode parecer fora de moda...

Mas, e se, tipo assim, nós procurássemos a turma toda? Mesmo que não consigamos reunir todos, lembrar de tudo, fazer tudo novamente, pelo menos estaremos deixando claro para nós mesmos e para o mundo que não fomos sós, que não estamos sós, que não seguiremos sós. Seria como um desagravo, um reconhecimento da parceria tácita e implícita que estabelecemos para a construção de nossa história. E serviríamos de exemplo para os que ainda estão. Estes que também se encontram em plena construção de sua história.

Porque, meu amigo, a minha história conta a sua história. E vice-versa.

Pabinha – 16/09/2011

Pabinha
Enviado por Pabinha em 18/09/2011
Reeditado em 16/11/2020
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