A vida é uma fresta.

O meu francês pouco, me deixa saber que "Oublié" é esquecer. E então descendo a tela pelo twitter, encontro isso, esse lugar "Oubliette". Não sei nem se dá pra chamar assim. De todos os lugares possíveis, uma Oubliette é o que menos parece com um, é na verdade, um "não-lugar."

Oubliette. Assim se davam os nomes das masmorras, o onde que se deixava o outro para ser esquecido, engolido pelo chão, pelo frio, pelo escuro silêncio. Num secar de fora para dentro.

A foto que eu vejo disso, dessa masmorra, é uma espécie de nicho quadrado no chão, uma abertura miudinha com grades de ferro. O cômodo parece que invade o asfalto como se fosse um ventre de baleia, uma baleia feita inteira de sombra, e depois desce pra baixo até cair.

Um dos meus medos maiores, eu acho, é o de ser esquecido. Não que eu precise ser toda hora lembrado, não é assim, mas ser esquecido é como estar numa Oubliette, é morrer e ficar vivo.

O México tem uma especial ligação com a memória, fazer a passagem é algo digno de festa, sagrado, não acaba quando acaba, pelo contrário, tudo é transitório. Ser esquecido é ainda pior, ser esquecido é "a morte da morte." Um dos meus filmes favoritos é "Viva, a vida é uma festa" e fala um pouco disso.

Nessa cena, Chichi, um espírito já bem velhinho, brilha vagalumeando e despermanece, é esquecido.

Miguel – Ei, espera aí! O que houve?

Hector – Ele foi esquecido. Quando nenhuma pessoa no mundo dos vivos se lembra de você, desaparece desse mundo, esse é o fim da linha!

Miguel – E qual o destino?

Hector – Eu não sei.

Miguel – Mas... Eu vou lembrar quando voltar para o meu mundo! Eu posso lembrar!

Hector – Não, não funciona assim rapazinho.

As lembranças tem que ser passadas por quem nos conheceu em vida, as histórias que contam sobre nós, mas não tem ninguém vivo para contar as histórias do Chichi.

Num dos meus últimos textos, "Recordatório", eu falei com as imagens paradas, as fotografias de infância, a metonímia de um tempo evaporado, oblívio.

Escrever, eu acho, é a minha própria metonímia. Quando falo sobre mim, minha família, conto histórias, escrevo, lamento, é como eu fujo da "Oubliette", a masmorra, o não lugar.

Quando sou palavra, evito que a vida vire fresta.

"Lembre de mim, hoje eu tenho que partir. Lembre de mim, se esforce pra sorrir. Não importa a distância, nunca vou te esquecer cantando a nossa música o amor só vai crescer. Lembre de mim. Não sei quando vou voltar. Lembre de mim se um violão você escutar.

Ele, com seu triste canto te acompanhará até que eu possa te abraçar. Lembre de mim"

*Um agradecimento especial para Clara Maria de Medeiros Borba, que fez um trabalho muito legal analisando o filme "Viva" (E, pelo que vi, ainda é minha conterrânea daqui de Natal)