A tristeza é senhora

A tenra imagem da moça que está estampada no frasco de alfazema não é tão pura quanto esta jovem que vos escreve. Se os unicórnios existissem, nós teríamos um encontro de almas. Que prazer que é arrumar a casa quando o que precisa ser arrumado está dentro da gente. Doce ilusão. Percebam que eu escrevi a palavra “prazer”, meu deus, que coisa mundana da minha parte.

Se eu fosse uma noviça, com certeza seria a noviça rebelde - um clássico. Que de rebelde não tem nada. Ela só se apaixonou. E quando a gente se apaixona, a gente fica idiota mesmo. Cria uma coragem besta. Uma determinação sem nexo (como se a paixão fosse conexa). Até as mocinhas inocentes cedem aos encantos dessa feitiçaria.

É assim que me veem. Como um exemplo “perfeito”, uma mulher direita, rara, pra casar, culta, um favo de mel, um anjo jamais deflorado. Pelo amor de Deus, não façam isso. Eu aceito ser um favinho de mel, mas só. Ouvi recentemente que é impossível arranjar uma mulher como eu, pois todas as outras são - digamos - “Genis”. Maldita Geni! Mas toda mulher já foi Geni um dia, toda mulher já foi Tieta, toda mulher carrega essa condição de ser mulher. E isso é impossível até pra quem é vista como “exemplar”. Eu não sou. Eu só sou alguém com medos, traumas e que tenta driblar as coisas da vida sendo a pior entendedora de futebol do mundo. Detesto. Até porque isso não resolve o problema, ele sempre volta como uma bolada na cara da gente.

Se o meu corpo ou o meu rosto mostrassem exatamente quem eu sou, acho que daquela lista não restaria nada. Conhecer alguém de verdade, e se deixar ser conhecido, parece uma tarefa pra quem gostaria de mim mesmo se a bruxa do 71 me transformasse em uma vassoura. Pelo menos eu seria útil. Limparia a casa e te levaria para passear, pois certamente eu seria uma Vassoura Voadora Blonde Turbo EXS (“EXS” significa “extremely sexy”). Pensando bem, isso seria extremamente estranho. Melhor não.

Tirando o “vassoura voadora”, o restante do nome está ótimo.

Eu bem que queria ser um objeto ou uma planta. Aliás, planta vive. E tem dias que viver é insuportável. Viver é sempre insuportável exceto pelos dias suportáveis. Queria não sentir as dores que sinto, queria não ser triste como sou. Eu sou mais triste que um samba, e o samba é filho da dor. Mas também é o pai do prazer. Seria eu o poder transformador? Não sei. As forças ainda não chegaram, queria arrancar a minha consciência fora e jogar no mesmo vale em que se encontrariam o coração, o estômago e todos os outros afetados. Não. Queria desativar o modo “vida” por tempo indeterminado. Uma semana ou 70 zilhões de anos. Queria fazer hipnoterapia se eu pudesse perder todos os meus piores medos ( e se uma sessão não fosse 500 reais). Queria ser tão de boa comigo a ponto de me pararem na rua pra dizer exatamente essa frase. E eu, muito descolada e sem um traço sequer de ansiedade, depressão, medo, tristeza ou feiura, abaixaria meus óculos de sol (assim como a Barbie na primeira cena do filme) e piscaria afirmativamente: “sim, eu sou de boa”. O que diria, implicitamente, que eu sou linda e feliz.

Não é um sonho?

Dá vontade de comer pra ver se faz efeito.