O PASSAGEIRO
O PASSAGEIRO
Para os sobrinhos – Lúcio e Paulo
[Castro Rosas]
O apito do trem anunciava a última chamada para os passageiros, sua permanência na estação ainda se prolongaria por mais cinco minutos antes da partida. Na plataforma, familiares se despediam com desejo de boa viagem e um breve retorno. Olhos lagrimejantes não escondiam a saudade que agora ficaria.
Nas janelas do trem, alguns já esticavam o pescoço fotografando na mente a imagem que guardariam para os dias de saudade.
As rodas da maria-fumaça são cadenciadas e lentas na partida, soando seu apito mais frenético e lançando no ar um rastro de fumaça, parece dizer: Vou-não-vou-Vou-não-vou, ritmo esse que pouco a pouco ia aumentando a cada tora de lenha jogada na fornalha.
Na plataforma rostos e olhares expressavam alegrias e tristezas no último aceno para quem partia em busca de sonho e esperança de um melhor futuro, a imagem encenava uma cena típica de enredo do final de um filme.
Aos berros, Paulo surgiu correndo na plataforma pedindo para que parassem o trem, no mesmo instante um coro de vozes começou a ecoar: “Maquinista, pare o trem”.
Instantaneamente, ouviu-se o ranger das rodas atritar sobre os trilhos, o condutor expondo a cabeça esticada para o lado de fora querendo entender o que estava acontecendo.
Paulo pulou na entrada do último vagão, que ainda não tinha saído do nível de elevação da plataforma.
Mais uma vez, o apito voltou a soar, e vagarosamente a locomotiva começou: vou-não-vou-vou-não-vou!
Dentro do trem Paulo procura por Lúcio, olhando o rosto dos passageiros, uma vez que Lúcio embarcaria no mesmo horário. Paulo foi andando de vagão em vagão até chegar ao primeiro, já que tinha embarcado no último. Olhou mais uma vez em volta e percebeu que Lúcio não embarcara. Tomado de um arrepio por se ver sem dinheiro e passagem, que estavam com Lúcio, ficou apreensivo. Que dizer ao cobrador? Como seria ter que descer na próxima estação, numa cidade sem parente, ou qualquer outra referência, para lhe dar abrigo ou mesmo fazer um empréstimo para que voltasse ou prosseguisse a viagem?
Cabisbaixo, sentou-se e ficou imaginando mil maneiras de como contornar aquela situação. Pensou em mandar parar o trem, mas sabia que seria impossível, pois a próxima parada ainda estava a muitos quilômetros, o que só aconteceria em quarenta minutos.
Paulo levantou a cabeça e, através do vidro da janela, passou olhar a paisagem deixando cair um olhar vazio e distante, desligando-se da sensação de angústia.
Por um instante começou a recordar do tempo de infância, das viagens que já fizera da fazenda do seu pai para a fazenda do padrinho, onde gostava de passar as férias com os primos, filhos da irmã do seu pai.
Paulo não percebeu o cobrador ao seu lado, que logo o reconheceu, trazendo-lhe boas notícias:
– Lúcio mandou avisar que, por canta de um desconforto abdominal, se encontrava no banheiro, o mesmo já apresentou as passagens.
Com um suspiro de alívio, Paulo recostou-se na poltrona sentindo a brisa do vento, enquanto ia observando as imagens passando em frente à janela.