ChatGPT e os versos alexandrinos

No final do ano passado foi lançado, nos Estados Unidos, uma ferramenta de inteligência artificial chamada ChatGPT, cuja capacidade de criar qualquer coisa referente ao intelecto humano (segundo os mais entusiasmados) vem causando grande estrondo na internet.

Desde que o computador conseguiu vencer, nos anos noventa, um duelo contra Garry Kasparov, tido por muitos especialistas como o maior jogador de xadrez da história, a evolução da IA tem surpreendido grande parte da população mundial. Mas vencer um ser humano em um jogo cujas jogadas são baseadas em cálculos lógicos-matemáticos não parece ser uma façanha das mais extraordinárias da parte de uma máquina que tem embutida em si algoritmos de uma calculadora, nem fazer receitas de bolo ou letras de músicas como estamos vendo com tanto alvoroço por aí.

Ontem, debruçado sobre a minha escrivaninha na tentativa de fazer alguns versos, resolvi colocar à prova essa nova sensação virtual e, então, entrei no site para constatar se essa inteligência seria, realmente, capaz de superar o homem na criação de uma arte na qual a beleza transparece tanto mais ele mergulha em uma introspecção sentimental-psico-filosófica dentro do seu espírito, isto é, na essência da criação poética.

A primeira coisa que fiz foi pedir para o ChatGPT me escrever uma poesia sobre amor. Não fiquei nada surpreso com o resultado, afinal, estava diante de versos feitos por algo desprovido de emoções e sentimentos; falta-lhe o maior ingrediente para compor isto que é visto como a maior beleza estética da mente humana, a arte poética. Os versos que apareceram na tela do meu notebook foram uma mistura de poesias feitas com a mesma pobreza de rimas de um adolescente apaixonado sem muita criatividade. Mas até aí tudo bem, afinal, muitos poetas péssimos estão inseridos nos cânones de diversas literaturas mesmo tendo uma inspiração semelhante ao da tal “inteligência” artificial.

Mas, então, resolvi ser mais duro com a queridinha do momento e pedi para ela me escrever um soneto com versos alexandrinos (para quem não sabe, um soneto é um tipo de poesia popularizada por Petrarca no século XIV, com um formato definido de métrica e versificação, composta de dois quartetos e dois tercetos, sendo que um quarteto é uma estrofe com quatro versos e um terceto uma estrofe com três versos, totalizando os catorze. Já o verso alexandrino é o verso composto por doze sílabas poéticas, as quais não são separadas da mesma maneira que as sílabas gramaticais. A escansão poética ou versificação é o nome dessa técnica de composição. Luís de Camões e Vinícius de Morais, só para ficar no âmbito da língua portuguesa, foram dois dentre muitos poetas que nos legaram com lindos sonetos), e, nesse momento, foi por água abaixo qualquer esperança de que eu pudesse ter de que uma inteligência artificial superasse o intelecto humano. O ChatGPT não conseguiu fazer nenhum soneto no formato do qual eu lhe pedi. Além das rimas continuarem sendo extremamente pobres, a quantidade de sílabas poéticas não correspondiam com a quantidade da qual se necessita para configurar um soneto de versos alexandrinos, apenas os quartetos e os tercetos estavam de acordo com a regra. Não tem jeito, um Virgílio, um Dante ou um Baudelaire nunca serão superados por uma mera máquina sem espírito e coração.

Igor Grillo
Enviado por Igor Grillo em 07/03/2023
Reeditado em 05/04/2023
Código do texto: T7734770
Classificação de conteúdo: seguro