Crônica de uma terça-feira (felicidade)

Amizades passam por fazer. Eu tenho poucos amigos, mas os que tenho são os melhores. Mas, não sei, parece que eu me sinto mais distante deles ultimamente – claro que em partes isso seja de mim, que sou mais na minha. Todavia, nas poucas interações sociais que tive recentemente, parecem que essas relações mudaram de alguma forma que eu não sei bem como explicar, caro leitor, apenas sentir.

Talvez seja aquilo, né? Amizades passam por fases, assim como os amores. Fase do grude, fase do silêncio, fase da demolição, fase da reconstrução. Por isso, talvez seja isso que eu esteja sentindo. Algo que é natural nas relações humanas, esse estranhamento, essa distância. Há amigos que eu falava sempre, que eram meus companheiros, mas que hoje eu quase não tenho contato. E amigos que eu julgava perdidos que voltaram para a minha vida. Mas amizade de verdade é estar presente quando o outro mais precisa. Eu sei disso, porque uma amiga, quando estava bem, com um novo namorado, saiu de cena, pois a felicidade a estava desorganizando. Mas aí voltou, quando o paraíso foi perdido, precisando de colo.

O que me leva a pensar em como muitas vezes nossa felicidade, bem estar depende do estar bem com o outro, geralmente um parceiro romântico – ou amigos também. Caro leitor, diga a verdade, você já condicionou a sua plenitude a outro alguém, que não si próprio, não é? Todos nós quebraríamos o nosso teto de vidro por essa pequena mentirinha.

A verdade é que a gente busca a felicidade como se ela fosse um potinho de ouro no final do arco-íris. Um cadeado do amor ideal deixado na Pont des Arts, em Paris. Como se ela viesse no acerto de seis números de loteria – que eu devia começar a jogar. Como se ela viesse numa bolsa de grife ou no carro do ano. No post bombado do instagram que te trará fama. Enfim, as possibilidades são muitas e você já entendeu aonde quero chegar, caro leitor. Cada um vai atrás da felicidade idealizada que julga sua, que acredita que ao alcançá-la, a vida finalmente entrará nos eixos.

Mas é aí que se engana, caro leitor. É justamente ao contrário. Aí é que a vida ficará de pernas para o ar.

A cada manhã, levantamos da cama com a esperança de que o dia nos surpreenda, mas muitas vezes é só mais um dia comum. Hoje foi um dia comum – e provavelmente amanhã também será, mas com o plus de ser feriado ebaaaaa – a questão é surpresas não são cotidianas, são sorteadas aleatoriamente, fugindo de nosso vão controle. É isso que eu entendo como estar no eixo. A estabilidade é a ausência de fortes emoções – o que não é de todo ruim. O que seria de nós se não tivéssemos uma pausa antes de cada euforia, tristeza avassaladora, problemas grandes e banais? Desejar algo e trabalhar para alcançar é estabilidade. Pois quando se consegue, aí que bagunça tudo e o tempo perde sua pressa.

A felicidade, essa danada alegria incontida, nos desorganiza, caro leitor. A felicidade é carnaval de rua, pulando sem sentir dor nas pernas, suando, rindo alto, fantasiada de algo irreverente e jovial, livre. Tira os sapatos, abandona o relógio, desalinha a rotina, nos torna radiantes.

Podemos ser felizes e ao mesmo tempo organizado, mas uma bagunça vez ou outra, se permitir não seguir à risca as convenções, tem o seu encanto e sabor. Faz parte da nossa efemeridade.

Enfim, seja um perseguidor da felicidade, caro leitor, seja ela uma pequena chama, encontrada nos afazeres diários ou no cometa do êxtase, esse adorável bagunçador de rotinas e cabeça, mas que nos deixa radiantes.

Belinda Oliver
Enviado por Belinda Oliver em 11/10/2022
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