Entre Príncipes e Sapos

Acomodada ao lado da janela, tem no colo a mochila onde leva o material de estudo. Sobre a mochila, o livro aberto – um romance – que lê, buscando não prestar atenção na rotina de mais uma viagem de regresso para casa. Sonhadora, vez ou outra permite que seu olhar fuja pela janela da condução e tente encontrar, em algum ponto do futuro, o momento em que o príncipe encantado entrará em sua vida. Distraída, assusta-se ao ouvir a voz grave que se dirige a ela. Meio sem jeito, pede desculpas, chega mais para o canto e volta à leitura.

Ele olha para o livro e vê que conhece aquele título. Já leu faz muito tempo. Esforça-se para lembrar de algum detalhe importante que possa servir para iniciar uma conversa. Com esforço recordar-se de uns poucos e esparsos detalhes e torce para que seja o suficiente.

Ela, educada, diante da pergunta feita, fala para ele o nome do personagem principal, que ele confessa ter esquecido, mesmo tendo lido e adorado aquela história.

Ele, rebuscando na memória, fala com ela sobre algumas passagens do livro, muita das quais – fica sabendo – ela ainda nem leu. Comenta fatos, acontecimentos e desfechos de algumas situações que aparecerão no texto.

Ela sorri sem graça. Percebe que seu livro teve a magia roubada. Desiste da leitura. Olha para fora, vê que é chegada a hora de desembarcar, guarda os pertences e prepara-se para sair.

Ele percebe sua intenção. Apressado, tira do bolso um cartão e passa para ela, pedindo-lhe que ligasse mais tarde para continuarem a conversa.

Ela recebe o cartão, levanta e se afasta.

Ele a vê se distanciar, dá um leve suspiro e pensa entusiasmado: “Que linda!”.

Ela, antes de saltar, disfarça e olha para ele, ainda não acreditando que ele tenha contado o conteúdo do livro. Amassa o cartão, joga fora e pensa: “Que velho imbecil.”.

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