Cadê Deus

 

          1. Amigos ateus veem me fazendo esta pergunta: Afinal, onde está o seu Deus nestes tempos de pandemia? Hoje pela manhã, esta cruciante pergunta botou-me a caneta na mão. E desafiou-me a responder aos meus queridos amigos incréus. Entrei imediatamente em pânico. Não sabia nem por onde começar, católico praticante que sou com passagens por seminários franciscanos. 

     2. Antes de tomar da pena, avaliando a gravidade da indagação, tive, sinceramente,  vontade de esquecê-la. Pois, de Deus, conheço muito pouco, considerando Sua imensurável grandeza e profundo mistério. Mas, depois de uma demorada reflexão, admiti, que ao meu modo, podia dar uma resposta ainda que não pudesse agradar nem a gregos nem a troianos. Uma opinião de um leigo ousado.

          3. Responder, sim, porém, tendo o cuidado de não dizer monstruosas herezias, a ponto de merecer, sem compaixão, os castigos do Altíssimo ou ser impiedosamente censurado pelos amigos crentes. Prometendo a mim mesmo ser coerente e sincero, decidi falar. Na esperança, também, de que o Altíssimo, benevolente, haveria, ao final, me compreender e me perdoar nos meus excessos.

          4. Então, como dizia Machado de Assis, "vamos ao que me põe a pena na mão",  respondendo aos ateus, meus amigos onde está Deus nestes tempos de pandemia avassaladora. Não sou o primeiro a tentar responder a esta pegunta. Os jornais estão veiculando artigos e mais artigos de gente dando explicações, umas coerentes, outras estapafúrdias. 

          5. Mas vamos lá. Bento XVI, hoje ex-papa, não tinha o costume de andar pelo mundo visitando suas paróquias; como fazia seu predecessor, o Papa João Paulo II, e como faz o seu sucessor, o Papa Francisco. Mas Bento saiu algumas vezes do Vaticano. Veio até ao Brasil abraçar os moços do mundo todo, no seu Congresso em Aparecida. 

          6. Pois bem. Dizem, que visitando um desses "campos de concentração nazista", não sei se o de Auschwitz ou o de Treblinca, teria perguntado onde estava Deus quando nossos irmãos judeus eram sumariamente executados pelos carrascos de Adolf Hitler.      Atenção: essa pergunta teria sido feita por Bento 16, um dos maiores teólogos do mundo; e para completar, um alemão da gema. Sua Santidade não fez uma pergunta leviana, penso eu. Sabia o que estava perguntando e porquê.

          7. Rescentemente, em brilhante artigo, o jornalista Hélio Schwartsman, da "Folha de São Paulo", fez sensatas considerações sobre a presença de Deus nestes tempos de pandemia. Do seu artigo, extraí dois tópicos que me ajudaram a não deixar meus amigos incréus sem resposta.

           8. O primeiro: "Conciliar o sofrimento presente no mundo com a existência de Deus onipotente e benevolente é um problema real, que desafia filósofos e teólogos das mais diversas tradições. E nem é algo que os religiosos procurem esconder".

           O segundo: "Em termos lógicos, a análise é simples. Se há um Deus onisciente, onipotente e benevolente, então não existe mal. Ora, há mal no mundo. Portanto, um Deus onisciente, onipotente e benevolente não existe". 

          9. O que pensa este cronista? Primeiro, que diante da pandemia, é difícil ser católico. Como católico, como testemunhar, de bico fechado, a bruta sacanagem que este covarde virus vem, há tempos, fazendo com a humanidade? Acho, por conseguinte, que o jornalista Helio Schwartsman tem lá suas razões.

          10. Diante do que de mal vem acontecendo, não seria o caso de se perguntar, como meus amigos ateus: onde está seu Deus nesses tempos de pandemia? É... Onde está Deus? Está ele, por acaso, vendo, sem se apiedar, seus filhos morrendo todos os dias, numa UTI qualquer, longe dos que os amam? Cadê Deus? Mas, mesmo com a catástrofe rolando, ainda há gente rezando ao invés de se vacinar. Morre um parente, e a pergunta não será outra, senão esta: pra que serviu tanta reza? Se escapa, sugere uma discriminação; ou foi milagre. 

          11. Não condeno quem acredita na misericordia divina, mesmo vendo os seus transpor os umbrais das UTIs. Só peço é que essa providência não tarde e por dois  motivos: para que os cemitérios não continuem sendo cada vez mais frequentados, parecendo que todo dia é "Dia de Finados"; e pricipalmente para que, diante do morticínio indiscriminado causado pelo covarde virus, não se fique a desconfiar da existência de Deus. 

Felipe Jucá
Enviado por Felipe Jucá em 08/02/2022
Reeditado em 09/02/2022
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