Sobre a Arte de Ser Moita

Se tem um estilo de comportamento humano que me intriga e até me causa certa admiração é a do sujeito precavido e introvertido, mais popularmente chamado de “moita”. Acho sinceramente que ser moita é uma arte congênita. Não tenho temperamento nem DNA para ser moita porque sou franca demais, falo demasiadamente sobre mim e meus anseios. Quando vejo já foi, contei o que não deveria para a última pessoa que deveria, mas jamais revelo o segredo de terceiros, conto os meus e essa “linguarudisse” já me causou inúmeras dores de cabeça. Sou fã do moita e queria ser um deles. Tenho uma amiga moita e a gente até já brigou porque eu reclamei da falta de confiança que ela tinha em mim, depois ficou tudo bem, mas ela continuou desconfiando porque não era nada pessoal, era seu modo de ser então não me importei mais. O amigo precisa botar tudo na balança e, se for o caso, aceitar o outro como ele é ou então dar adeusinho.

O moita domina a arte de observar minuciosamente a todos o tempo inteiro enquanto eu o observo, eu saco a parada dele (mas isso ele não percebe, porque está mais preocupado em ocultar o que pensa e diz). Geralmente tem olhos grandes que escaneiam o interlocutor por inteiro, mas não costuma fitá-lo nos olhos. Elementar, meu caro Watson, os olhos entregam o ouro que a boca não está nem um pouco a fim de contar. Ele está fechado em copas, mas é curioso, esperto, quer saber a jogada do outro, só não quer pagar para ver. Aliás, desconfio que alguns espécimes de moita nutrem uma pequena inveja de certas pessoas com quem interagem, mas tentam esconder atrás da … moita, fato facilmente detectável através de um rápido exame de sua linguagem corporal como já mencionei antes.

Uma metáfora boa para ele é pensar que guarda uma trena no bolso para medir suas palavras e assim não gastar nenhuma que não seja ultra necessária. Arrancar histórias de sua vida, projetos e principalmente do seu passado é algo que beira o impossível porque parece que estão num cofre cuja chave ele engoliu. Ele pode ficar décadas em sua vida sendo super simpático, mas praticamente um desconhecido, um ponto de interrogação, mesmo sendo leal a quem gosta. Se você lhe fizer perguntas ele vai responder laconicamente e logo devolver a “bola” com outra pergunta, é bem típico dele.

Também podemos imaginá-lo como uma coruja na entrada de sua toca observando tudo com seus olhos imensos, mas que ninguém a culpe de nada, para todos os efeitos ela não viu nada, não a comprometa, por favor. Seria com certeza um espião top de linha, já que não contaria para quem trabalha nem sob tortura. Ou será que nesse caso abriria o bico? Vai saber…

Por falar pouco é considerado comedido e educado, mas em parte é técnica de defesa, afinal, as paredes têm ouvidos, uma pessoa prevenida vale por duas, seguro morreu de velho e em boca fechada não entra mosca, shhh…. Todo mundo sabe que a fofoca é uma praga pior que as redes sociais e rola por aí desde que o mundo é mundo, corre pelas portas, elevadores, escadas, ganha as ruas, cabos telefônicos depois vai realmente para o Twitter, Insta e Face. E com fatos aumentados, muito aumentados. O moita nunca corre esse perigo, ele se blinda, e se tiver perfil nas tais redes sociais é para ler e no máximo curtir o que seus conhecidos publicam, não é doido de postar. “Information is power” (Informação é poder) é o seu lema, e não é que é mesmo? Danadinhos esses moitas. Mas quer matar um deles do coração? Faça-lhe uma surpresa, ele pira porque sai do script. Tudo que sai do seu controle e planejamento é muito perigoso para ele porque foge da sua zona de conforto. Pensando bem, não faça isso com ele não, tadinho.

Vamos ser justos com o mineiro, que tem fama de ser o brasileiro mais moita que tem, o mais desconfiado. O mineiro é boa-praça e hospitaleiro, gente boa demais, sô. Caso se descuide vão lhe fazer de gato e sapato, sua casa vai virar um Airbnb, está muito certo em agir sempre pensando no bem, mas olhando a quem e de se resguardar fazendo boca de siri. Quisera eu ser assim.

Ser reservado é salutar já que ninguém traz escrito na testa quais são as suas reais intenções, o exagero é que incomoda. Uma pitada de superstição também não é pecado, pois se bem não fizer, mal também não fará. Toc toc toc, bate na madeira.

E para encerrar o texto com o pé direito, pé de pato, mangalô, três vezes!