LEMBRANÇAS – CASO DE PASSARINHO

Em frente à minha casa, na rua Almenara, onde passei parte de minha infância, havia uma árvore, não muito grande: uma guapuruvu, conhecida também como birosca. Lembro-me de que pendurei em um de seus galhos um alçapão que eu mesmo fizera. Com talos de embaúba e pedacinhos de bambu, bem trabalhado. Fui para a escola e deixei, ali, a armadilha para pegar passarinho.

Muito bem. Quando cheguei, à tardinha, eis que percebo que naquele pequeno alçapão havia um passarinho preso e ele se debatia furiosamente querendo sair. Era uma coleirinha, novinha, bonitinha demais. Recolhi cuidadosamente o alçapão e, carinhosamente, peguei a pequena ave com as mãos para transportá-la para uma gaiola de arame que tinha em casa. Não demorou nada e ela, debatendo-se muito, agarrou a cabecinha entre dois arames da gaiola. Coitadinha! Ela se machucou tanto que sua cabecinha perdeu uma grande quantidade de penas, sangrando-se. Pensei. Soltá-la? Vai morrer. Passei água com sal e mercúrio na ferida do pobre passarinho. Quase chorei de tanta pena do bichinho.

Do lado de minha casa, morava o senhor Serafim, um vizinho que também gostava muito de passarinhos. Contei para ele o acontecido e pedi-lhe um conselho: como fazer para curar aquele prisioneiro que, por ser tão arrebatador, acabou-se machucando demais? Ele, imediatamente, me disse: Se quiser fico com a coleirinha. Vou cuidar dela. Tenho aqui um passarinho muito manso que canta bastante: um pretinho. Você quer ficar com ele e me dar a coleirinha? Vou cuidar dela com todo carinho. Indagou-me. Concordei e fizemos a troca.

Não muito tempo se passou e a coleirinha, com a cabeça meio pelada, começou a cantar e o senhor Serafim, contente, ficou com ela durante um longo período. Até quando não sei.

Hoje, com a idade que tenho, me deu vontade de dividir esse acontecimento com meus leitores. Acho que mais por desabafo. Tenho muito arrependimento de ter prendido tantos passarinhos em gaiolas. Penso bem diferente agora. Não acho justo prendê-los. O certo é deixá-los livres, soltos na natureza, cantando alegremente.

Fico imaginando: quem sabe aquela linda coleirinha não teria ficado desesperada ao se ver presa e ter deixado em seu ninho um monte de filhotes? Meu Deus! Por que naquela época não pensava como hoje: os passarinhos nascem para ser livres e cantar tranquilamente nos galhos das árvores. Eu acredito que não tinha maturidade suficiente, quando garoto. Tinha o prazer de pegar os lindos bichinhos e colocá-los em gaiolas. Felizmente, nos dias de hoje, a mentalidade das pessoas mudou um pouco. Ainda existem aqueles que têm o costume de prender e vender animais silvestres. Os que estão em gaiolas, geralmente, são pássaros de origem estrangeira e nascem em chocadeiras feitas pelo homem. Menos mal.

BH, 27 de junho de 2021.

LUIZ GONZAGA PEREIRA DE SOUZA
Enviado por LUIZ GONZAGA PEREIRA DE SOUZA em 27/06/2021
Reeditado em 08/07/2021
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