Das Minhas Lembranças 3

Éramos sobreviventes da ditadura de 1964 e queríamos derruba-la. Energia não nos faltava. Atuávamos em várias frentes, sendo o movimento sindical de oposição à diretoria pelega e a construção de um partido político dos trabalhadores as principais.

A greve de 1979 dos metalúrgicos de BH e Contagem foi o batismo de fogo para muitos de nós, inclusive eu. Num piquete da portaria da Mannesmann, um policial se colocou ao meu lado. Discretamente ele me deu um choque nas coxas com um cassetete. Foi como se levasse um coice de mula. A vontade que tive foi de dar-lhe um murro. Segurei a raiva. Tinha consciência que era provocação. O que não aconteceu com um companheiro na portaria da Belgo, que revidou com um soco. Ele foi colocado num camburão. Ignácio Hernandez, Berzé e Sálvio Pena, que desciam a Avenida Babita Camargos, foram revistados.

O que mais me preocupava era as possíveis demissões que viriam depois da greve. Dois em especial: Seu Raimundo, morador de uma favela na região do Barreiro e Rui. Eles abriam suas casas para as reuniões de organização. Seu Raimundo, uma pessoa simples, com filhos, como tantos outros. "E se Seu Raimundo perdesse o emprego". Para os parâmetros da época, o salário da Belgo era razoável.

Outro personagem enigmático foi o Zé Raimundo, o Vermelho. Ele fazia discursos inflamados nas assembleias, mas na hora de a onça beber água, o Vermelho amarelou: furou a greve! Para não passar pela portaria em que os piquetes estavam, ele arrebentou a tela que dava acesso à fábrica.

Seis meses depois, já em 1980, às vésperas de maio, de duas datas significativas para mim, fui demitido. Dia primeiro, dia dos trabalhadores. Dia 12, data de nascimento de meu filho, Fernando.