Voltar a ouvir o barulho do carro de boi.

Era mês de agosto, mas podia ser qualquer outro mês do ano, quando resolveu por em prática um desejo antigo de retornar para casa da roça.
Havia alguns motivos para esse período sabático de reflexão e encontro com as origens, um desejo nostálgico de reencontrar com o passado, somado a uma dose de "saco cheio" de movimento de pessoas e compromissos com horário marcado para tudo, tempo sempre insuficiente e uma sensação esquisita de solidão mesmo cercado por muitas pessoas, o que fez com que a carga estressante resultasse em um ligeiro pico hipertensivo com um episódio perda súbita da consciência, que ao faze-lo parar em um pronto socorro, ecoou como um aviso, como se uma voz de advertência vinda de algum lugar alertasse:
- Stop!
A forma que achou de desligar para uma viagem introspectiva foi retornar para casa, sem se importar com a ausência de sinal do wi-fi , ou que canal de televisão com 568 opções que mal dava para percorrer com o controle remoto.
A casa estava como que a espera-lo de braços abertos,tanto que ao abrir a porta sentiu como uma volta ao passado. O fogão de lenha o fez reviver antigos instantes de prosa com sua mãe que agora não mais estava ali para dizer a frase que tanto traduzia afeto:
-Cuidado com o sereno!
A mala não estava pesada, pois apenas algumas poucas peças de  roupas lhe bastariam nessa viagem de volta as raízes.  O terno e as camisas de marca para reuniões sérias com diretores importantes não seria necessário. Era um período de longas caminhadas pelo cafezal, e trilhas para busca de cachoeiras, sendo que os únicos barulhos que haviam era do vento no canavial e o carro de boi que emitia um som estridente mas nada parecido com o trânsito louco da grande cidade. Ao entrar em casa viu o retrato na parede no tempo que ainda tinha cabelo encaracolado sem nenhum fio branco como no dia atual. A cadeira de balanço ali estava para reviver uma época que sua mãe dizia:
-Espera aí que vou coar um café.
Ao chegar no quarto ao lado da cama o livro sagrado, e a frente ao alto a imagem de Nossa Senhora que retratava a fé e a certeza que aquele era um lugar abençoado.
Simbólicos sinais de recordações de instantes que de fato nunca havia saído de dentro de si.
O menino que corria pelo terreiro e brincava de pescar no córrego que corta a propriedade, junto com os primos, ainda vivia dentro daquele homem.
Os próximos dias seriam de muitas lembranças.
Agora não havia a companhia do primo Antônio para as pescarias de lambaris, nem a presença do Zé Homero para o gol a gol no terreiro de secar café.
Havia no entanto a visão do horizonte na varanda, e nesse momento, junto com a calma do verde que sobressaia a sua frente, veio a certeza de viver alguns dias serenos de paz, e isto era tudo o que mais precisava...