QUARENTENA
 
Não resisti, tive que vir aqui contar pra vocês um episódio que aconteceu comigo nesta quarentena. Quarentena não, CENTENA, pois ainda esse mês, irei completar cem dias de confinamento. A quarentena, é preciso, previne, de modo, que eu estou obedecendo. Mas tem situações que me deixam aperreado. Esta que vou contar, é uma delas. Evito sair de casa, por segurança e porque odeio andar de máscara. A gente não respira direito, quando um fala o outro não entende direito e no meu caso que preciso usar óculos, ele fica embaçado... enfim, são muitos dissabores. Mas se é pra nossa proteção, usemos! Como disse, evito sair de casa, mas segunda-feira, fui obrigado. No sábado, meu dente se desentendeu com a restauração e ela se separou dele, de modo que aquilo ficou como uma lâmina, cortando a minha língua. Sem alternativa, tive que ir ao dentista. Agora, as pessoas saem à rua, como uma fera amedrontada, olhando para os lados com a cara de assustado, com medo de encostar em alguém, ou alguém encostar na gente. pior até de que quando se anda em rua deserta e tem medo de ser assaltado. A sensação é que a pessoa ao lado, está com medo de você, está com medo que você chegue perto... mas você também, tem essa sensação. Parece que se alguém te tocar, você cai ali mesmo. Pois bem, cheguei ao consultório e depois de falar por trás da máscara por duas vezes o meu nome, tive que entregar minha carteira de motorista para a atendente saber como eu me chamava. Aguardei uns quarenta minutos, que pareceram duas horas, olhando com certa desconfiança, aquele povo ali em volta. Um senhor com a camisa do palmeiras, olhava insistentemente para a jovem da recepção. O porquê eu não sei, mas estava me incomodando. Até porque com aquela máscara não dava pra saber se a criatura era bonita. Bom, eu é que não quero contato com esse povo. E se algum deles estiver contaminado, atrás dessa máscara? A sala dos mascarados. E nessa profusão de pensamentos ouvi a pronúncia do meu nome na sala 13, me dirigi pra lá, bato na porta, entro e o dentista, baixa a máscara, me olha com uma cara de espantado e pergunta com um certo sarcasmo: você, é DONA ISAURA? Envergonhado, voltei pro meu lugar, a tal da dona Isaura, entrou, depois outro paciente e eu ali impaciente com vontade de voltar pra casa sem o tratamento, pois cada um que entrava e até a recepcionista, disfarçadamente, me olhavam e riam com os olhos, por detrás daquela máscara. Mas meus ouvidos são capazes de jurar, que o dentista, tinha chamado mesmo era ADONISVALDO!

S. Paulo, 05/06/2020
Adonisvaldo CORDEIRO