A NECESSIDADE DE FICAR

A vida de dona Vivi, mãe de três filhas, era sempre tranquila, com a rotina comum a uma dona de casa, cujas atividades dividiam-se entre idas ao centro para compras e serviços bancários. Havia ainda aquelas atividades que recheadas de encanto divertiam a vida da viúva de setenta anos e aumentavam a sua alegria: eram as visitas à casa das amigas, conversas com as vizinhas e principalmente a chegada das filhas. Nessas ocasiões, a casa de dona Vivi era tomada pelo movimento e algazarra dos netos. Duas meninas e um garotão.

O tempo passou ...pouco tempo passou, até o dia em que uma nuvem negra tomou conta de tudo e a notícia de um vírus chegou à cidade. Uma ameaça pairava no ar, ameaçando a vida de todas as pessoas. O Inimigo desconhecido, o vírus fatal, tinha suas vitimas prioritárias e, nessa hora, os setenta anos da moradora da rua das Orquídeas, foi fator preponderante e responsável pela reclusão da septuagenária, que de uma hora para outra, viu-se aprisionada dentro do seu próprio lar. Ela, uma idosa ativa e saudável encontrou-se inserida em um grupo de risco, sendo seu isolamento necessário para evitar torna-la um agente receptor ou transmissor da moléstia, cuja possibilidade de proliferação instalava o medo, o caos.

Mesmo sabedora, ser sua situação comum, nesse momento, a um número muito grande de pessoas, nada evitou que sua condição humana lhe traísse, através de um emocional descontrolado, nervoso e sensível, exposto a todo tipo de notícias e, principalmente, pela falta de conhecimento da veracidade das informações.

Mas dona Vivi, mulher com princípios religiosos, ergueu então seu olhar para o alto, para o céu e passou a usar a oração, a sua grande ferramenta, para acreditar na passagem de tudo e na esperança de um mundo melhor. Dessa forma, entendeu que o seu lar, seu eterno porto seguro, era, agora mais do que nunca, o que lhe assegurava a necessidade de ficar.

CEIÇA
Enviado por CEIÇA em 22/03/2020
Reeditado em 25/03/2020
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