Quem te faz sorrir?

Tu estás indo encontrar alguém. Seu pai, quem sabe seu irmão, um amigo... Vai muitas vezes pelo dever, pela obrigação. Não me leves a mal, são pessoas que amamos, que precisamos. Mas deve ter entre elas uma que parece ter nascido para fazer os outros rirem. Alguém que causa certa euforia com a expectativa de rever. E é bem possível que essa pessoa não possa te ajudar com outras coisas além de te provocar aquelas risadas desconcertantes.

Geralmente são pessoas excessivamente práticas. Se tu falas do teu problema no trabalho ela diz: — Mete o pé nessa bosta, faz algo que te faça feliz. Se você reclama da relação ouvi um: — Porque não diz na cara, separa porra! Se dizes do quanto estás sem dinheiro recebe um: — Tá chorando de barriga cheia!

Realmente é melhor não criar expectativas quanto aos conselhos de um sujeito desses.

Mas pensando bem, se alguém não te faz feliz, não consegue te arrancar aquelas risadas longas e fininhas que até parecem uma ambulância passando, essa pessoa também não tem de ti o que tu esperas dela. Precisamos esquecer um pouco da lógica e fazer como nos desensina o amigo inconsequente. Escolher um emprego que nos dê prazer, pessoas que nos façam bem, lugares agradáveis... Lugares agradáveis sempre estão cheios de pessoas agradáveis.

Esse é o nosso débito com a gente mesmo.

Esperar? Esperar o quê, a morte eminentemente imprevisível e traidora? Esperar as coisas mudarem, as pessoas mudarem?

Não, quem espera fica sempre no mesmo lugar. Por isso que sentimos desejo de encontrar com nossos amigos extrovertidos. Quem sabe porque vemos na sua inconsequência uma janela onde passa um filme de quem deveríamos ser. Certamente não tão doidos assim, mas muito mais quem somos e muito menos o ser paradoxal que nos tornamos, de tanto ouvir a nossa consciência.

Afinal, quem determina quem somos? O eu que está convencido que os próximos 30 anos vão passar ainda mais rápido, e que sem nenhum milímetro de hipocrisia sabe da certeza de que só tem dessa vida para gastar? Ou desconfias que quem te diz o que deve ser feito está nos bastidores da tua mente te entregando as verdades que comandam a tua vida? Aquele que segura uma placa dizendo “você está sendo filmado” e que é responsável por não te deixar fazer merda. Aquele que diz dane-se não vou pedir desculpa, que acha que o mendigo só não tem o que tu tens por que ele não trabalha. Que persegue os adolescentes no afã de evitar que eles sintam prazeres que por certo não saberiam como administrar.

Adivinha, é tua consciência despejando inutilidades sobre os outros assim como fizeram contigo. Te tornaste o parente, o amigo chato e as pessoas vão perder pouco tempo contigo.

Mas tenho uma boa notícia, ainda dá tempo. Saia para a rua, veja no que dá. Passe vergonha, ria de si mesmo, seja inconsequente e quando alguém estiver sério demais fale idiotices. Se rirem de ti por que chegaste atrasado, pelo resvalão que destes na calçada, por estares sem dinheiro ou porque tu és péssimo no que faz, não perca o salto. Ria também até que saia aquele som de um porco na risada (sempre temos um amigo que ri assim).

Como dizia García Márquez “são os riscos de se estar vivo.” E os vexames, que remexem com tudo aquilo que é normal e aparentemente correto, são muito mais atraentes do que discursos morais.

Então me diga, quem sempre te faz sorrir?