ESCREVER PODE SER PERIGOSO
      Fernando Sabino dizia que Otto Lara Resende era bom de prosa. Eis que assim, além de gostar de conversar, ele também gostava de escrever. Mas, fosse por descuido ou qualquer outro motivo, andou escrevendo o que não devia.
     Aos 35 anos publicou seu segundo livro de contos intitulado "Boca do Inferno", deixando muita gente escandalizada com as histórias que contou. Consta que, logo após o lançamento da obra, ele saiu de livraria em livraria, recolhendo exemplares do livro, completamente insatisfeito com sua façanha literária. O pai dele, ao tomar conhecimento do teor do livro, demonstrou grande decepção e desgosto. E foi o primeiro a repreendê-lo de forma severa, por meio de uma carta. Por carta, também, Otto Lara Resende pediu perdão ao pai por tudo que escreveu.
     Na época, o escritor trabalhava como diretor da revista "Manchete". Alegando esgotamento nervoso, e por causa da repercussão negativa da obra, pediu demissão do cargo e mudou-se com a família para a Bélgica. Ainda assim, não conseguiu se livrar de alguns incômodos e aborrecimentos, depois da publicação do tal livro. Certa feita, fosse por protesto ou questão de vingança, a porta do apartamento dele, em Bruxelas, amanheceu cheia de fezes — conforme relatou Autran Dourado.
     É, escrever ás vezes pode ser perigoso, dependendo daquilo que a gente escreve; porque certas coisas não devem ser ditas nem tão pouco escritas.
Sei de alguns escritores que pagaram muito caro pelo que escreveram. O próprio Fernando Sabino pagou um preço altíssimo, quando por infelicidade escreveu o livro "Zélia, uma paixão". Ele, que estava cotado para fazer parte da Academia Brasileira de Letras, não foi aceito. Por causa daquele escorregão, o nome dele foi rejeitado. O mais interessante é que ele, um escritor de renome, não foi admitido como membro da Academia de Letras, mas o Sarney foi: quanta injustiça!
       Posso não escrever tão bem, mas coloquem um livro diante dos meus olhos e logo direi se ele é bom ou ruim — disso muito me orgulho, porque nunca me ocupei de certos livros.
       Outro dia, entrei numa livraria e folheei um livro de José Sarney. E com a maior convicção posso garantir — escritor é coisa que ele nunca foi e nem tão pouco será, ainda que viesse ao mundo por mais vezes.
 
JOTA SANTIAGO
Enviado por JOTA SANTIAGO em 22/10/2019
Reeditado em 17/03/2020
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