AS FRIAS MADRUGADAS DE CURITIBA DE OUTRORA

AS FRIAS MADRUGADAS DE CURITIBA DE OUTRORA

A noite era fria e a insônia me atormentava. Virava-me de um lado para outro e não conseguia me acomodar. Os números do relógio digital piscavam, mas o tempo não passava. Eu torcia para que os primeiros raios de sol invadissem as frestas das venezianas. Para me distrair comecei a prestar atenção aos murmúrios da noite, mas a noite era muda e silenciosa. Eu só conseguia distinguir o ronco de motos boêmias e carros notívagos cortando a escuridão.

Então, comecei a relembrar dos velhos tempos de infância. Como as noites eram diferentes. Ao invés da violência dos dias de hoje as noites de antigamente eram mágicas. Lembro de sentir o perfume de flores noturnas nas caminhadas de outrora. Ao invés dos meliantes encontrávamos as carrocinhas dos padeiros e o perigo que corríamos era pegar um resfriado ou dar uma topada em algum macadame distraído que estivesse no caminho.

Outrora, as madrugadas eram até mais frias. Quem ainda dorme com acolchoado de penas de ganso? Em nossa casa, no bairro do Ahú, ouvia-se os latidos dos cães madrugadores. Primeiro um próximo e, em seguida a resposta de outro, mais distante. E a sinfonia canina não parava. Aumentava até se tornar um coral de latidos desafinado.

Quando iniciava a primavera, os sabiás laranjeira ecoavam seus cânticos madrugada adentro. Havia quem reclamava e eu juro que daria tudo para ouvir novamente aquele canto tão lindo.

E os sapos? Nunca mais ouvi sapo cantando. Quando íamos à casa de minha avó, na Santa Quitéria, atravessávamos os campos aos sons noturnos da saparada. O que teria acontecido com eles? Curitiba não é mais a capital dos sapos. Logo, a Escola de Samba Sapolândia ainda vai ter que mudar de nome.

Os vaga lumes merecem um capítulo à parte. Também debandaram. Enfeitavam as noites de verão riscando lindos desenhos no céu. Nunca mais os vi.

Curitiba dos velhos tempos. Curitiba dos campos cobertos por lençóis brancos de geada. Curitiba da grama crocante de gelo. Curitiba, tu não é mais a mesma. Curitiba, te quero de volta enfeitada de noiva. Volta para mim minha Curitiba “on the rocks”.

CLEOMAR GASPAR
Enviado por CLEOMAR GASPAR em 02/09/2019
Código do texto: T6735683
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