Foi Deus. Foi sim

Aqui em Alter do Chão, no Pará, o povo é muito simpático e cordial. A Ilha do Amor tem a praia mais bonita do Brasil.

Conversei com os nativos, ouvi suas histórias, busquei informações onde poderia fotografar vida selvagem. Todos foram muito receptivos, apontaram as direções e fizeram recomendações:

- Nunca ande sozinho nos igarapés. Aqui tem cobra sucuri de 300 quilos. Se ela se jogar em cima de você, adeus! Cuidado com os troncos das árvores com muitas folhagens, ali se escondem as cobras coral e surucucu. Se você for picado por uma cobra não saia do lugar, não ande, não se mova senão o veneno circula mais rápido no seu sangue e, adeus!

Em alguns lugares fui sozinho. Em outros, com os guias. Nesses passeios ouvi suas histórias, lendas e causos.

- Aqui na Floresta Nacional do Tapajós tem o Curupira.

- Falei com entusiasmo: - Meu pai e meu avô falavam do Curupira, ele tem os pés para trás.

- Outro dia ele apareceu para um fotógrafo de São Paulo. Se você tiver sorte pode tirar o retrato dele. Eu vi a foto. Ele é cabeludo, muito feio. Estava senado no pé daquela Sumauma.

E as histórias continuaram.

- Seu João, está vendo aquele calango ali? É o Tumaquaré... O homem que toma o chá do rabo dele, fica bestinha pra mulher... Deixa ela ir sozinha pro carimbó, dá todo o dinheiro pra ela, enche ela de perfume... o cabra fica abestadinho! Depois o senhor ouve a música que Dona Onete fez pra esse calango, que diz assim:

“...Ele fica abestado

Abobalhado, bobão

Pateta, patetão

Pilotado, pilotado

Só faz o que você quer

Com chá do tamaquaré”

Estávamos sentados na sombra da Samauma, ‘a árvore da vida’, demos uma boa gargalhada e a conversa em torno do marido abestado se esticou por um bom tempo. Havia várias pessoas na roda.

No canal do Jari visitei o belo jardim das vitórias-régias que é cuidado pela família da simpática Dulce. Além da alegria que ela estampa no sorriso. Enquanto ela oferece uns petiscos feitos da planta símbolo da Amazônia a prosa solta deixa-nos com vontade de passar a tarde inteira conversando. Tudo isso faz planejarmos o retorno.

Brinquei com fotografia de rua.

- Oi amigo. Você tirou fotos da minha filha. Você poderia mandar pra mim?

- Sim, claro. Qual o nome dela? Veja, ficaram lindas! Posso publicar na minha página?

- Odara. Pode publicar sim. Ficaram lindas mesmo. Obrigado.

Certo dia cheguei a uma aldeia indígena no rio Tapajós. Entrei na mata à caça de uma linda pipira roxa, pássaro que eu não conhecia. Havia um grupo de uns seis homens numa conversa animada embaixo de uma frondosa mangueira. Cumprimentei-os e pedi permissão para adentrar na aldeia à procura de pássaros.

- Claro. Pode sim. O senhor já tirou fotos de outros?

Mostrei o visor da câmera: - Já sim. Vejam este albatroz, tirei de dentro da canoa vindo pra cá.

Eles se aproximaram e ficaram encantados com a foto.

- Um deles ficou tocado pela foto e exclamou: - Linda foto, muito bonita!

- Outro afirmou: - O senhor apertou o botão na hora certa.

O mais velho da roda, com o semblante compenetrado e voz pausada, exclamou:

- Foi Deus!

Houve um silêncio, um suspense no ar... Com o coração contrito, confirmei:

– Foi sim!