Uma Oração.

Cinco da manhã. Hora da oração.

Não peço nada, não praguejo o Mundo nem os homens, não desejo bens materiais e não quero malandragem, como cantou Cassia Eller. O que eu queria já se foi: uma família.

Minha filha sequer aceita me ver. Apenas abre uma fresta no portãozinho da frente de sua casa, sob o argumento de que o cachorro, chamado kalel, possa sair, me dá um beijo de leve no rosto e sempre diz que está com pressa ou atrasada para algum compromisso.

Minha ex-mulher me odeia de morte pelo simples fato de eu não ser rico e não ter me tornado rico como os príncipes de seus sonhos juvenis. Diante isso alienou minha filha a nutrir ódio pelo pai. A ambição humana é uma grande merda! Uma grande merda! Como pode? Certas coisas nunca consegui compreender: vingança, ódio, mágoa, rancor..., nunca entendi essas coisas. Nunca! Desde criança, quando presenciava uma crueldade, por mais insignificante que podia parecer, me doía muito por dentro.

Nunca me esqueço de um final de ano, quando ainda criança de nove anos, em que presenciei o abate de um porco para os festejos... Festejos?? O grunhido daquele animal miserável ecoa até hoje em minha cabeça como um pedido de socorro que nunca pude atender. Sou um fraco!

Minha oração, à qual não tem regras nem cultos (acredito em Deus, mas não sigo religião) é um simples lacrimejar em silêncio no escuro do quarto na vã esperança de que as lágrimas amainem minhas dores e emanem um leve frescor a todos os corações, almas e mentes obscurecidas e embrutecidas pelas agruras mundanas.

Só isso.

Cristiano Covas
Enviado por Cristiano Covas em 14/06/2019
Código do texto: T6672523
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