Personografia
Depois do beijo no coreto da praça, o vestido azul de escola nunca foi
mais o azul, nem o beijo e nem a vida. Mesmo sendo o ano do primeiro
amor; passou rápido, e a estação da jabuticaba, dezembro coroou.
Conceição, conheceu o dissabor do primeiro amor. Numa cidade de
interior, pequenos fatos particulares, são notícias de jornal, tudo que
acontece é coluna social, a desgraça alheia é contentamento
comemorado.
Casada, anos mais tarde – o homem honesto e simples que não era da
roça adoeceu – e ela teve de gerenciar além da economia do lar, o
fogão e o fusca, a limpeza da casa, a assistência para maiores
abandonados filhos. Altercada, por um falecimento prematuro de um
lindo filho, assim mesmo, saúde e sintoma sobravam no dia dia dela. A
casa do falecimento ficou de mudança e sua vida nunca mais parou
nas mesmas paredes brancas de apartamento nenhum. No natal, papai
noel não conhecia seu novo endereço, entre mobílias e contas,
preocupações e choro contido, aquela garra de mulher moderna se
assomava a perspicácia e a experiência. Dois pintinhos ficaram em
suas asas: pintinho a) — o marido doente, motivo de comédia e
alegria, reencontrava a infância], pintinho b) — o filho, alegre e
trabalhador, não renunciava a mãe].
Ela aceitava o jugo e o fardo; e não reclamava; sua única filha —
esteio de vontade e firmeza — nem de muito longe e nem de muito
perto meditava por ela. Conceição; agradecia, e Rosa desapegava de
memórias feias para enfim reconstruir uma nova mãe. Quase todo ano,
depois da morte do filho mais moço, ela se mudava, vendia o
apartamento reserva e comprava um titular, vendia o titular e
comprava dois reserva, vendia e comprava, negociava na qualidade de
advogada de si mesma. Assim, e sempre assim, sempre que as notas
chegavam, sorriso e alegria nunca envelheciam.