...A Menina que apenas existia...
Ainda de olhos fechados, respirou fundo e levou seus dedos ao seu próprio pescoço onde tateou até sentir a sua pulsação.
Sim estava viva!
Mas seu corpo estava mórbido, incompreensivelmente mórbido.
Abriu os olhos e não havia nada ao seu redor, apenas o vazio, sem cores e sem forma.
Tentou pensar no que havia ocorrido, mas não haviam lembranças. Teria batido a cabeça? Então teria sofrido um acidente, será? E como isso ocorrera? Não haviam lembranças.
Foi apenas ao se levantar que percebeu que não conseguia enxergar o seu corpo. Sentia-o, podia tocá-lo… mas não havia corpo.
Levantou suas mãos em frente de seus olhos… não haviam mãos.
Afagou seus longos cabelos, deixou-os pender pelos seus ombros e seios, mas não haviam cabelos.
Se agachou, tocou seus pés, cada dedo, pode senti-los um por um, dez no total, mas não haviam pés, tampouco haviam dedos.
Abriu a boca, passou a língua pelos dentes, sentiu a textura carnuda de seus lábios secos, umedeceu-os e então ensaiou a vogal “a”… nada. Tentou limpar a garganta, mas nem isso, não havia nem um ruído se quer.
Conseguiria andar? pode sentir seu corpo se erguendo e ficando ereto, levantou uma perna, uma perna que não existia ali, pisou no chão que não havia, com o pé que não tinha, moveu seu quadril invisível e pôs-se a avançar com a outra perna imaginária. Caminhou por um tempo indeterminado naquele “lugar nenhum” e apenas conseguiu chegar a “nenhum lugar”…
Não, não estava perdida, pois não havia um lugar de onde veio nem para onde voltar.
Ela apenas existia, sem corpo, sem identidade, sem lembranças e sem lugar.