Grand Finale

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Grand Finale - Henrique de Albuquerque

Chego exausto do trabalho, esparramo minhas costas largas na cama velha de retalhos, sinto uma sinergia preguiçosa fazer meus músculos relaxarem e, pela primeira vez em três longos dias, meus olhos cerram.

Quatro horas depois, acordo atordoado; percebo ondulações espasmódicas nas minhas costas, o sino lombar mais uma vez badala minha agonia e não consigo descansar, estar deitado me parece estar em pé. Meu coração, em arrancada, vem me lembrar dos meus serviços do dia, ou melhor, meus desserviços na vendinha: o patrão se irritará novamente e eu derrubarei os produtos junto com minha moral como sempre fiz. Eu levantarei e caminharei até o ponto ou simplesmente ficarei na cama, em pé e deitado ao mesmo tempo, esperando o tempo comer meus olhos e a as formigas –curiosamente– comerem meu dia?

Decido me levantar dessa lama que chamo de "cama" e ir até meu cocho, comer minha alfafa e seja mais o que estiver jogado na geladeira branca velha. Rumo a gélida amiga, marchando um passo de cada vez(os quais se eu os estendesse ao máximo não daria mais que três metros) me sinto nas ruínas de Nínive, e nesse momento reparo como meu chiqueirinho é até bem trabalhado: 1 parede e quatro portas, qual delas deve cumprir minha vontade com mais rapidez, será que se der sorte minha cabeça racha em pouco tempo na superfície mais macia? Antes de chegar na suposta vaca de tripas geladas vejo, no reflexo do espelho quebrado que de alguma forma pendurei no telheiro, uma carniça ambulando; não lembrasse que eu ainda sou quem sou ela me espantaria.

Ah, novamente o vento range as telhas e levanta a poeira em meus pés, e infelizmente a luz que perpassa as gretas da pequena portinhola de madeira consegue alcançar meu berço por excelência, procuro logo mais lençóis para as tapar: hoje não saio do meu refúgio espiritual!

Minha mente sai correndo para todos os lados, mas assim como meu corpo repete os passos, ela colide com a parede de uma forma rápida e seca: um suave barulhinho de córrego se destaca no ambiente.

Eu sinto o sabor do vermelho e o odor do amarelo: minha vida era tão amarela quanto era meu barraco, ou melhor, quanto era minha vontade de continuar; meu barraco agora é tão vermelho quanto o sangue arterial que minha carótida esguicha na imensidão pequena do lugar em que terminou minha (vida?).

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Henrique de Albuquerque Mello
Enviado por Henrique de Albuquerque Mello em 17/10/2018
Reeditado em 25/10/2018
Código do texto: T6478902
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