BRANQUELA CUSTOSA

Esta música foi gerada por um caso verídico. Mas como raramente sói divulgar o nome do santo, aqui também só conto o milagre.

De repente nosso herói resolveu trocar a filial, uma morena até bem apessoada, por outra branca também provida de atributos físicos, só que bem mais nova. Enquanto isso a matriz, coitada, nem sabia da extensão da expansão do negócio.

Aproveitei a deixa e fiz um samba contando a história e mostrei na nossa reunião do apartamento do Dantas o presidente do Clube do Camelo, nosso “grupo musical”, que hoje seria chamado de “banda”. A minha música estava prontinha e terminava com “Eu devia era ficar numa boa, fritando a batata no óleo Patroa, mesmo que fosse coroa” chamei o samba de “Branquela custosa”.

Todos gostaram, mas o Eduardo, logo disse:

- Posso colocar letra em uma segunda parte? Ao que respondi, pode e esperei pra ver o que acontecia. E lá, na hora, ele começou com “O nego depois dos quarenta...” e completou a ideia. Sugeriu batizar como “Perdi pra mim mesmo”. A melodia ficou a mesma, só que com uma segunda parte de letra diferente.

Aprovei, mas como o personagem dele era bem mais novo que o meu, para contemporizar, coloquei cinquenta em vez de quarenta e, apoiado por todos os outros membros do Clube, mantive o “Branquela custosa”. Afinal a história pedia um nome mais escrachado. Nunca se soube quem era o personagem do Eduardo como também nunca disse a ninguém quem era o meu. Só ficou implícito que os dois existiram, agora fundidos num só:

BRANQUELA CUSTOSA

(Almir Morisson e Eduardo Queiróz)

Troquei minha nega queimosa

Que tava manhosa

Por uma branca aguada qualquer,

Tá certo que a branca era nova

Mas eu desconfio

Foi que dei mancada, mulher,

O caso que a grana era preta

Mesmo com a branquela

Que situação,

Já não tenho idade pra isso

Mais de um compromisso

Faz mal pra pressão,

Eu devia era ficar numa boa

Fritando a batata

No óleo patroa,

Mesmo que fosse coroa...

O nego depois dos cinquenta

Já não se aguenta

É barra meu irmão,

Fazendo dois supermercados

Duas contas bancárias

Afora o cartão,

Tentei bancar o boa pinta

Meu drama só sinta

Dei de Don Juan,

Perdi todas duas prum pinta

Com menos de trinta

Que era meu fã,

Não tenho mais como argumentar

Perdi pra mim mesmo

Melhor é parar,

Acho que vou descansar...

Esta música tornou-se pra nós um “hit” do Clube do Camelo, tanto que a inscrevemos no festival de música da Rádio Cultura e chegou a conseguir uma boa colocação.

O negócio foi assim:

Normalmente, em festivais, os músicos, quase sempre colegas de outras bandas, nada cobram pela participação. Pelo menos aqui em Belém é assim, ou tem sido conosco. Fica apenas um compromisso, implícito, de que qualquer prêmio em dinheiro, será dividido pelos participantes.

Para a fase de classificação, quem fez o arranjo e nos colocou entre os dez primeiros, foi o contrabaixista, também excelente, o Adelbert Carneiro, colocando até um violoncelo no grupo. Porém, na final, o Adelbert não pode participar e o substituímos pelo Kzam, já nosso velho conhecido, com a bagagem de ter atuado na França e na banda que acompanhava Elis Regina.

Fizemos um ensaio no local do evento e, no outro dia, fomos tentar o título. Pegamos o quinto ou sétimo lugar, não lembro bem, com aquele samba gostoso meu e do Eduardo, a “branquela custosa”, e sétimo ou nono com “Ússu de Pêxe” do Gervásio com o Firmino. Ficamos comemorando até mais tarde e, quando o garçom veio com a conta, além do consumo do dia, cobrou mais oitenta e poucas cervejas. O Firmino, que é e o tesoureiro do Clube, reclamou muito, mas o garçom justificou que tinham sido consumidas, no ensaio do dia anterior, pelo “barbudo e barrigudo que tocava baixo”. Era o Kzam, que como não estava mais, nem pôde se defender. Apesar do protesto generalizado, o jeito foi pagar.

Se de fato nosso baixista tivesse tomado todas, nada teríamos a reclamar, pois sua boa vontade e participação, sem cachê, valiam muito mais. Mas todos pensamos que o garçom achou a gorjeta pequena, e quis tirar proveito da situação, inspirado no tamanho da pança do Kzam.

Escute a música em: https://www.recantodasletras.com.br/audios/cancoes/79570