AMOR INOCENTE

1990, turma do oitavo série (hoje 9º ano), Marcia era uma garota extrovertida e fazia amizades com muita facilidade, inclusive comigo, uma menina tímida e que se deixou envolver pela nova amiga para enturmar-se. Através dela, todos da sala falavam comigo e das outras turmas também. Apesar de eu não aprovar certas atitudes da Márcia, tinha suas qualidades, como por exemplo, dividir o lanche ou ainda ajudar-me com matemática. Estudávamos juntas desde o sexto ano, mas fomos ser amigas mesmo apenas no ano seguinte, quando me livrou de uma situação constrangedora, que não vem ao caso agora.

Sentada no pátio da escola, sozinha, distraidamente a olhar o tempo a minha volta, percebi um garoto alto o suficiente para idade de aproximadamente 13 anos, pele clara, olhos verdes e cabelos castanhos lisos caindo na testa. “UAU”!!!! Pensei ou falei, não sei. Fiquei absolutamente hipnotizada e não consegui tirar os olhos dele. Passava por mim, sem perceber minha presença. Desde então, comecei a paquerá- lo, a olhá-lo sempre que possível. Constantemente, via- o rodeado de meninas e meninos. Descobri que se chamava Carlinhos, era da turma de futebol da escola e uma série a menos que eu.

Vivi esse amor platônico sem ter coragem de contar para ninguém. Guardei no mais íntimo do meu ser. Ele não iria me querer se soubesse, pois eu era uma garota gordinha e com algumas espinhas no rosto. Bem, isso era o que eu achava. As amigas dele eram bem mais bonitas. Conformava-me e respirava fundo.

Minha turma ficava no primeiro andar, e a dele no térreo. Quando tocava para o intervalo, eu corria para janela, na esperança de vê-lo sair da sala, sem que percebesse que estava sendo observado. Numa dessas ocasiões, fui correndo para janela e a minha amiga Márcia veio junto. Nesse mesmo tempo, vejo-o sair da sala, lindo e maravilhoso, quando escutei alguém exclamar:

- Que gato é esse? Minha nossa! Dany, você está vendo? – Márcia pergunta toda animada. E continuando com suas investidas... – PSIU!! PSIU!! – Insistentemente até o Carlinhos olhar para cima. Justamente quando ela se escondeu e quem ficou paralisada a olhar para baixo, fui eu. Morta de vergonha, pela primeira vez ele me encarou e sorriu da situação.

Dei a maior bronca na Márcia:

- Você não deveria ter feito aquilo. Agora ele pensa que fui eu, tudo por culpa sua. – Desabafei.

- Deixa de besteira porque irei resolver tudo. Fica tranquila, tá boa amiga! Ele é lindo e eu quero namorá-lo. Falou toda decidida.

Entrei em desespero. Como assim “namorá-lo”? Ela não poderia fazer isso comigo. Eu o tinha visto antes e me apaixonara primeiro também. ´Tentei fazê-la mudar de ideia.

- Márcia, olha só, você nem ao menos o conhece. Viu ele hoje. Não pode namorá-lo assim de repente.

- Querida Dany, você irá ajudar-me. Preciso saber tudo sobre ele, o que é fácil de descobrir. E em seguida irei declarar toda minha paixão. E saiu.

Fiquei passada e ao mesmo tempo sem ação. Ela estava mesmo decidida. Como eu iria contar para ela sobre os meus sentimentos por Carlinhos? Com certeza iria achar que estaria com inveja. Iria questionar porque eu não havia contado antes. E agora? Não poderia pôr em risco a nossa amizade. Resolvi calar-me e ver no que ia dar nessa história.

Passaram-se algumas semanas depois do ocorrido e nossa amizade continuava a mesma, com um detalhe, minha amiga queria estar sempre próxima onde ele estivesse. Tentando chamar a atenção dele, sem muito sucesso. Percebi que o rapaz não era tão fácil assim de ser conquistado, apesar da Márcia era muito bonita, não tinha atraído a atenção do garoto.

Depois a todo esforço, sem sucesso, resolveu escrever um bilhetinho para ele, convidando-o para conhecê-la, dizendo-se estar interessada por ele. E ficou decidido que eu iria entregar, justo eu. Protestei, mas sem sucesso.

Respirei fundo peguei o bilhete e fui procurá-lo. Ah, como estava nervosa, ansiosa e quase sem ar. Andei por todo pátio da escola e nada dele. Perguntei a alguns garotos e dissera-me que ele estava na quadra, próximos aos banheiros. Chegando no ginásio segui em direção aos vestiários, logo vejo-o sentado lendo. Aproximei-me e fiquei ali parada olhando, contemplando-o, quando ele resolveu cruzar o seu olhar com o meu. Ficamos assim por alguns segundos, até ele tomar a iniciativa, dar um “oi” e saber o porquê de eu estar ali. Fui logo falando sem freio.

- Vim trazer um recado para você. A minha amiga pediu para te entregar isso. – E entreguei o bilhete. Fiquei esperando enquanto ele lia o que estava escrito. Ao terminar, ficou em silêncio a encarar-me. Impaciente, perguntei: - E aí? O que digo a ela?

- Aqui diz para eu comparecer a sala de artes, daqui a vinte minutos, pois Márcia quer me conhecer. – Falou sorrindo. Mudando um pouco de assunto. – Você é a garota da janela. Aquela que sempre baixa os olhos quando a encaro e que ficou vermelha há alguns minutos quando olhou em meus olhos. – Ainda sorrindo, aproximou-se e pegou minhas mãos. – Nossa, como estão geladas!

Interrompendo-o, puxei-as devolta e encarei-o mais uma vez. - Preciso de uma resposta. - Falei eufórica.

- Diga a sua amiga que não vou. Não estou interessado em garota oferecida, que fica fazendo de tudo para ser vista ou aceita. Só porque é bonita acha que tem que ser assim. - Disse bem tranquilo. – Eu quero saber mais sobre você. Tudinho! Não precisa ficar envergonhada. Não quero saber da Márcia.

Por um momento fiquei sem entender, pensei que estivesse brincando comigo. Fui contra minha vontade e de repente escuto o garoto mais bonito da escola dizendo que quer me conhecer. Eu não era um padrão de beleza considerável, gordinha e com espinhas. Sem falar na timidez. Contudo, não impediu que ele preferisse a mim. Ficamos conversando sem perceber o tempo passar. Descobrimos que tínhamos muitas coisas em comum, inclusive que morávamos no mesmo bairro. Olhei para o relógio.Precisava voltar e tentar explicar para minha amiga, sem causar confusão.

A Márcia estava esperando impaciente, com cara de poucas amigas. Quando me viu chegando, foi logo pedindo explicações. A princípio, perdi a voz. Não sabia por onde começar. Foi então que Carlinhos surgindo do nada ao meu lado, e falou:

- Márcia, não fale assim com a Dany. Ela apenas fez o que você pediu. E como você exigiu resposta imediata, vim junto para te dizer que não estou a fim de conhecê-la e muito menos ter alguma coisa contigo. Obrigado por aproximar-me desta linda jovem que tem muitas qualidades e confesso, já estava tentando chegar junto, mas não sabia como. E você facilitou tudo.

Então, pegou minha mão e fomos embora deixando-a decepcionada e ao mesmo tempo surpresa por não acreditar que fora trocada por uma gordinha sem graça, inconformada, pois sempre conseguia o que queria.

Apesar de toda confusão, gostava dela. Passados alguns dias, tentei explicar que antes de tudo, eu já tinha um sentimento por ele. Mas, ela nunca mais quis saber de mim. Desprezou-me o quanto pode. Se fui falsa, não sei. Apenas aproveitei a oportunidade para ser feliz.

E assim, ficamos juntos até...

Débora Oriente

Debora Oriente
Enviado por Debora Oriente em 30/03/2018
Reeditado em 11/03/2024
Código do texto: T6295097
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