A Tristeza Vizinha

A Tristeza Vizinha

Dona Mariquinha era uma vizinha, o apelido a descreve, pequena, magra, frágil, velhinha. Morava num barraco, desses que parece que estão afundando, inclinados. Era impregnado do cheiro de carvão em brasa e fumaça do ferro de passar roupas, eu achava que era o cheiro da pobreza. Sua subida era bem mais longa, a gente a ajudava com as sacolas, sempre tentava nos dar um trocado, fomos proibidos de aceitar.

Um casal de italianos idosos, moravam num sobradão e alugavam o térreo, tinham uma empregada menina, a Pretinha. Cedo eu reconhecia a exploração, sentia empatia com a situação da criança e antipatia dos velhos.

A família Venturim chegou bem depois, ficamos amigos daqueles irmãos e irmãs, adolescemos juntos. Quando a Águeda faleceu numa cirurgia cardíaca inevitável, a perda foi nossa também. Uma noite traumática ao telefone, comunicando aos amigos e tentando explicar o inexplicável, uma jovem morta, sem doença, numa operação agendada.

Outra época, mudou-se para o lado uma família. Pai alcoólatra, já na fase do delirium tremens, a mãe submissa, penúria batendo na porta, um nenem morreu de pneumonia. Por muito tempo me culpei por aquela criança, será que faltamos em alguma coisa? Hoje compreendo que eu era muito jovem, e impotente. Às vezes, a infância dói.

Jmmotta

03/03/2018