E se fui eu mesma?

Algumas vezes na vida, precisamos mudar. Chega um momento em que aquela nossa velha realidade já não mais nos cabe e uma força surge dentro de nós. De repente, a rotina que antes nos continha torna-se a prisão que escolhemos enquanto nossas roupas parecem estranhas demais. Digo roupas mas me refiro às roupagens, aquelas que nos vestem todos os dias, bem cedo, logo quando acordamos e nos moldam até a hora de dormir.

Hoje cedo, num desses momentos de sorte que a vida nos dá, encontrei numa crônica da Martha Medeiros a seguinte indagação: e se quem não esperássemos que somos for, em verdade, quem a gente é (pela primeira vez)? Eu explico: e se nunca tivermos sido nós mesmos, na ânsia de continuarmos habituados ao "eu" que esperam que somos? E se, quando nos deparamos com uma reação inesperada estivermos nos sendo como nunca antes? Talvez nos falte coragem.

Há muito esqueci de mim. Há muito, perdi-me em meio a ansiedades inexplicáveis e escondi-me nos livros que estão sempre comigo. Escondi-me, também, nos tantos sorrisos que entreguei, inocente, por medo de me mostrar (pra qualquer um na rua, beija-flor). Esperei pacientemente por uma felicidade que nunca veio e, um dia, decidi buscá-la. Corri. Corri até não enxergar nada além do futuro, até minhas pernas não aguentarem mais, e encontrei-me.

Hoje, um desses amigos de longa data questionou se éramos ainda tão amigos, afinal, estava tão diferente! Foi assim que, finalmente, conheci um desses momentos que descreve Martha Medeiros: não disse nada, apenas disse que estaria ali, caso quisesse conversar. Eu, que sempre me importei demais, que sempre me preocupei com a opinião dos outros bem mais do que com a minha, que sempre desejei amigos mais do que a minha própria companhia, calei-me. Foi quando, por um momento, me conheci. Talvez nunca tivesse tido a paz para simplesmente ser, pra desligar-me, pra me permitir ser feliz, independente de qualquer um. Já não me importava mais.

É, Martha Medeiros, algumas roupagens já não nos servem mais.