Sobre assédio, cantadas e “elogios”

Um dos temas mais em voga atualmente é o tal do “empoderamento feminino”. Procurando o significado mais exato do termo na internet, li que “é o ato de conceder o poder de participação social às mulheres, garantindo que possam estar cientes sobre a luta pelos seus direitos, como a total igualdade entre os gêneros, por exemplo”.
 
Lado a lado com esse termo, vem outro, combatido à exaustão (às vezes até com um certo exagero): o “machismo”. De volta à pesquisa, encontro que “machismo é o comportamento, expresso por opiniões e atitudes, de um indivíduo que recusa a igualdade de direitos e deveres entre os gêneros sexuais, favorecendo e enaltecendo o sexo masculino sobre o feminino. O machista é o indivíduo que exerce o machismo. Em um pensamento machista, existe um "sistema hierárquico" de gêneros, onde o masculino está sempre em posição superior ao que é feminino. Ou seja, o machismo é a ideia errônea de que os homens são "superiores" às mulheres”.
 
Coloquei esse preâmbulo para melhor ilustrar o que, de fato, quero abordar aqui: o assédio masculino. O machismo é algo cultural. O patriarcado é a regra, com raríssimas exceções ao matriarcado, geográfica e historicamente. Assim, por estar tão enraizado nas pessoas, muitas vezes alguns comportamentos são encarados como naturais e, até, elogiáveis. No mundo ocidental moderno, nos grandes centros urbanos, entre as pessoas esclarecidas, isso está começando a mudar. Mas ainda muito lentamente. O caminho é longo e árduo. Nem vou falar aqui dos povos mais primitivos, onde a mulher ainda é totalmente submissa, explorada e maltratada. Vou focar em algo bem simples, bem corriqueiro, que, certamente, toda mulher já vivenciou ou, ao menos, presenciou: a “cantada”.
 
Homens, por favor, mulheres NÃO GOSTAM de ser abordadas na rua. Numa cidade grande e violenta como o Rio de Janeiro, por exemplo, todos saem às ruas com medo de serem assaltados. Mas as mulheres, ainda que, como eu ao ir à academia ou ao mercado, não levem nada de valor, levam consigo o medo. Medo de serem abordadas, de serem assediadas, de serem violadas. Imaginem. Estou eu indo para algum lugar. Só isso: saí de casa para ir a um lugar qualquer. Não estou procurando nada, não estou fazendo nada, não quero nada a não ser chegar ao meu destino. De graça, um cara passa por mim, se inclina e diz "gostosa". Não, eu não me sinto elogiada. Eu me sinto MUITO invadida. Ainda que ele tivesse dito "linda", eu me sentiria incomodada.
 
Ilustre desconhecido, se, ao cruzar com uma mulher na rua, ela lhe chamar a atenção por sua beleza, por favor, registre a informação e arquive em sua memória. Não precisa dizer pra ninguém. Eu canso de ver homens lindos nas ruas e não falo nada. Não viro a cabeça quando eles passam. Não assobio. Não faço sons obscenos com a boca. Não "elogio". Isso é, no mínimo, constrangedor. Eu já deixei de entrar em lojas porque senti olhares estranhos dos vendedores. Deixei de comprar coisas de que precisava por medo. Aqui mesmo, na padaria ao lado da minha casa, um dos vendedores, sempre que eu entro, baixa os olhos para minha genitália. Isso é EXTREMAMENTE DESAGRADÁVEL. Outro dia, fui tirar fotos para um documento num estúdio que usa manipulação para melhorar a foto. Ao entrar, eu perguntei se eles realmente usam recursos para deixar a gente mais bonita. O rapaz respondeu: "mais?" Fiquei constrangida. Eu não pedi elogio. Eu só queria uma informação.
 
Homens, por favor, coloquem-se no nosso lugar. Não tentem entender, porque vocês nunca passaram por isso. Não, vocês NÃO SABEM como é. Recentemente, num desses inúmeros programas gastronômicos que pululam em nossa rede televisiva, este destinado a cozinheiros crianças e adolescentes, uma chef mirim, uma menina de não mais que 13 anos, talvez, linda sim, mas uma CRIANÇA, foi objeto de comentários obscenos e maldosos na internet. Isso me deu uma tristeza sem fim. Chorei por ela e por seus pais, ao ler as postagens babacas a respeito da menina.
 
Quando tiverem vontade de agir de forma machista, pensem em suas mães, filhas, irmãs... Sim, eu sei que a maioria dos homens foi criada para agir assim. As mães de hoje estão tentando criar seus filhos de forma a quebrar esse paradigma. Ensinam a respeitar as mulheres, a dividir as tarefas domésticas, a encarar as pessoas como iguais, sabendo que ninguém é superior a ninguém e que todos estamos aqui para conviver, em pé de igualdade de direitos, uns com os outros. Vejam: não estou dizendo que homens e mulheres são iguais. Não são e nunca serão. Há diferenças físicas, emocionais, psicológicas, hormonais, etc. Mas os DIREITOS são iguais.

Então, você, homem que foi criado à moda antiga, que ouvia “homem não chora”, “isso é coisa de mulherzinha”, “mulher gosta é de homem safado” e outras aberrações, entenda que sempre é hora de mudar. Não faça esse papelão. Não “cante” uma mulher na rua. Não é bonito, não gostamos, não queremos, não estamos pedindo! JÁ DEU! Podem parar!

Assédio tem muito mais a ver com poder e dominação do que com atração sexual propriamente dita. Isso é coisa de homem que ainda pensa que a mulher é inferior. E o pior é que temos que ouvir e ficar caladas, para que a situação não se agrave ainda mais. Se vocês soubessem a raiva que dá...
 
Se não te contaram, vou te contar agora: sabe do que nós mais gostamos? RESPEITO!
 
Obrigada.

 
Rosa Pinho
Enviado por Rosa Pinho em 29/10/2017
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