ROUBANDO SORRISOS

"O que nos leva a escolher uma vida morna? A resposta está estampada na distância e na frieza dos sorrisos, na frouxidão dos abraços, na indiferença dos "bom dia", quase que sussurrados." - Luis Fernando Veríssimo.

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Voltava do mercado quando ao passar defronte uma casa, pela porta aberta, viu sobre a mesa da sala um esquecido sorriso bobo.

Ele – viciado em sorrisos – perguntou para seus botões: "Será que a dona sentirá falta?". Entrou sorrateiramente, capturou o sorriso-bobo-esquecido, jogou-o numa sacola e, depois, em desabalada carreira, deixou o local do crime.

Mas então lembrou que existe um enorme problema nessa vida de roubador de sorrisos: O sorriso roubado pode não funcionar se a dona não perceber que ele foi roubado.

Pensando nisso, para se autodenunciar, voltou ao local do crime.

Pela porta ainda aberta, viu a dona da casa procurando por algo sobre uma mesa vazia. Entrou sem ser convidado, tirou uma coisa invisível da saco que trazia nas mãos e fez que depositava a tal coisa invisível sobre a visivelmente-vazia-mesa-da-sala. A dona da casa olhou para a mesa-sempre-vazia, olhou para ele que parecia um mensageiro aguardando resposta e, sem saber o que fazer naquela situação estranha, sorriu o sorriso mais belo que ele jamais havia visto.

Ele, hipnotizado, encantado com tão luminoso sorriso, suspirou muito-muito fundo e confessou aliviado: “Espero que você perceba que esse sorriso tão lindo que você acabou de sorrir já havia sido roubado. Esse seu formoso sorriso de agora, na verdade, nunca foi teu, eu já o havia roubado, e ele, mesmo antes de nascer, já era todinho meu!”.

O sorriso dela se embelezou mais ainda e os dois, ainda nos tempos de hoje, encontram-se frequentemente para trocar sorrisos furtados, ora de um, ora do outro.

ooOoo