Inspira... Expira...

Inspira...

Meu coração está acelerado. Minha respiração está calma. Minha audição ouve como se estive 1,25 mais devagar; eu percebo o som que cada instrumento faz; a voz dele ecoa pela minha cabeça... até em lugares sujos e escuros.

O horizonte já é um velho conhecido dos meus olhos - que sempre o fita como se fosse um sonho. Minha pele sua, meu sorriso se abre no canto da boca.

Sinto como um fogo dentro dos meus ossos...

O cheiro sobe para minha mente perdida, que segue o odor e ver um campo florado.

Expira...

Meu olho esquerdo abre uma brecha. A luz da rodovia me faz perceber: estou na realidade. Tudo foi uma visita ao paraíso. Minha respiração está normal, meu coração ainda se acostuma ao plano material, minha audição está ok.

Inspira... e se afunda.

A realidade e a fantasia são mundo tão próximos de mim! Parecem duas avenidas. E eu estou na esquina - onde posso correr de uma à outra.

Um dia me fizeram acreditar que estar nessa esquina é ruim e que eu poderia enlouquecer qualquer dia desses. Acreditei, mas busquei respostas. Me sentei e comecei a notar que outras pessoas diariamente passam por essa mesma esquina diversas vezes; e que eu sou o equivalente a uma criança que brinca na calçada.

Embora criança, eu sei que uma dessas calçadas acabam e que existem outras esquinas ao redor desse quarteirão - talvez seja por isso que eu não opte por seguir uma dessas calçadas.

Vez ou outra eu invento de atravessar uma das avenidas. Ops! Esqueci de respirar...

Expira... e rapidamente inspira.

Vez ou outra eu invento de atravessar uma das avenidas e me deparo com uma calçada de mendigos de atenção, curtidas no Facebook, pedem poder, perdão vazios e oferecem artes vagabundas, como corações remendados se passando por novos. Eu, particularmente, não gosto dessa calçada. Acho que é aqui que os loucos, como me disseram, ficam e esperam por um bondoso ou interessado em autopromoção.

Na outra calçada, um rapaz pede mais compreensão. Olhando por fora, ele é cego de um olho, moletom dois números maior que ele, escuro e sujo de tinta e pó colorido, com um carrocel flutuando sobre sua cabeça (também sujo de pó colorido e tinta seca); uma menina vestida de cosplay de alguma personagem japonesa respira fundo e parece impaciente; um vendedor de cordéis, velhinho; duas senhoras gêmeas: uma rodeada de panelas de barro e a outra com crochês.

Inspira mais... e solta tudo. Mergulha de novo.

Existem mais crianças na fantasia que na realidade. Normalmente são mais adultos, com aparência cansada e impacientes. Muito impacientes.

Expira... e inspira.

Eu, definitivamente, gosto da minha esquina, onde me oferecem dinheiro, me confundem com prostituto, artística ou até mesmo louco. Já conheço os pombos e pardais da calçada - e cada um tem um nome -, já sei a hora dos ônibus.

Expire... Inspire... Não pire!

Nossa realidade é muito pesada para eu viver somente nela. Se eu for enlouquecer, prefiro ficar com a fantasia.

Diego B Fernandes Dutra
Enviado por Diego B Fernandes Dutra em 06/09/2017
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