Na calada da noite

Era por volta de três da manhã.

Acompanhada de seus amigos, companheiros, de risos, cafés, CDs de Caetano, Chico, Los Hermanos e tantos outros, vindos de um show fanta laranja, cantando pelas ruas, madrugada à dentro.

Na calada da noite, no silêncio que só a noite proporciona, eles, seus amiguinhos, são os únicos que ao avistar aquele grupo barulhento, rompendo o silêncio, parece de fato entender o quão bonita é a escuridão.

- Meus amiguinhos! Grita ela, sob o efeito de várias latas de Smirnoff ice.

- Os brasileiros não sabem como tratar a sua gente!

Grita a outra, num idioma que chegava muito próximo do espanhol, e que naquele momento todos tinham a certeza que era espanhol. E eles sorridentes, retribuem com sorrisos e buzinas.

- O que seria das ruas sem os lixeiros? Grita ela.

E foi assim que nasceu uma amizade que dura até hoje. Onde quer que ela vá, tem sempre um lixeiro que lhe sorri, ou que buzina lhe chamando a atenção. E desde então, ela olha para essa gente com olhar terno, de quem reconhece o quão duro, desvalorizado, e discriminado é o seu trabalho. E o que é mais intrigante, é que sem eles, todos, sem exceção, viveriam num lixão. E mesmo assim, são vistos com olhos diminutivos.

Acordemos.