Talvez uma crítica social - Temos tempo?

O dia começa com você se dando desculpas por ter que acordar cedo quando você quer dormir mais. Essa autoindulgência é tão venenosa! Nos acostumamos a nos manter reprimidos e fazendo coisas que não queremos, mas fazemos porque precisamos. Precisamos comer, precisamos comprar, precisamos vender, precisamos produzir, precisamos pertencer, precisamos…

Às vezes nos achamos tão fortes e tão fracos, embora, francamente, não estejamos assim.

Nos arrumamos, penteamos nossos cabelos, amarramos a cintura com um cinto preto (não pode ser de outra cor), pintamos nossas unhas com as cores da empresa (a empresa não permite outra cor; principalmente se for concorrente), permanecemos no armário, vamos de ônibus ou xingando o motorista da frente (aquele “burro” que não usa seta). Pintamos nossos cabelos para permanecer jovens e sinalizar para a empresa “nós somos jovens! Veja nossos fabulosos cabelos castanhos em pleno os 60 anos”, dirigimos em ruas específicas, seguimos orientações de guardas de trânsito que só se preocupam em dar multas sem sequer saber a Legislação de Trânsito completa (a mesma que permite multar os carros oficiais [incluindo a viatura dos guardas de trânsito] que estacionam na calçada, por exemplo).

Horário para acordar, horário para pegar o transporte, horário para chegar no trabalho, horário para almoçar, horário para responder o e-mail, horário para respirar (não temos! Existem prioridades), horário para pegar o filho na escola, horário para brincar com ele (também não tem. Você sempre está muito cansado sem saber o motivo verdadeiro), horário para sair do trabalho, horário marcado no dentista para extrair o siso que biologicamente não precisamos mais (sequer precisamos dos outros? Só engolimos a comida mesmo), ih! Esqueci de que estava com vontade de ir ao banheiro enquanto um cálculo renal se forma porque você também não tem tempo de beber água – que é somente aquela que você bebe para empurrar a comida engolida)… Você está bem? Se sente bem? Consegue pensar? Consegue trabalhar? Consegue?! Corre para o outro trabalho.

E tudo se repete.

O tempo livre é escasso. Escasso se desprezar o tempo gasto nas redes sociais, o tempo gasto enviando mensagens e boatos, tempo no corredor do trabalho fofocando sobre a vida do supervisor gay ou sobre a funcionária que, embora verdadeiramente feliz agora, precisa ouvir “sinto muito pelo divórcio”. Realmente não temos tempo? Vocês conseguem ser melhor que isso?

Exigências, pressão psicológica, trabalho, estudo, turno extra em casa ou na casa alheia, revista de fofoca, tempo para saber sobre os avanços da Ciência ou ler o Diário Oficial que informa o aumento absurdo para o Judiciário, Executivo e Legislativo, enquanto a maioria da população praticamente passa fome com um salário mínimo para morar perto do trabalho ou gastar com transporte se morar longe. Você verdadeiramente não tem tempo? Ou seu marido não te ajuda nas tarefas de casa? Você não tem tempo de viajar? Por quê? Você está bem? Consegue estudar? Consegue?! Vá agora! Sem ensino superior você não vai conseguir ganhar um salário mínimo e mais um oitavo.

Mais valia não caiu de moda. Só nos alienamos mais com o que as pessoas – os empresários, que também são políticos e donos de jornais e emissoras de informação – nos diz. E também dizemos que não temos tempo de verificar a veracidade das informações em fontes fidedignas que, embora raras, ainda existem; mas temos tempo de verificar a veracidade daquela fofoca que apareceu na publicidade do Facebook.

Você está bem? Conseguiu ler? Foi assustador? Talvez não.

Diego B Fernandes Dutra
Enviado por Diego B Fernandes Dutra em 23/07/2017
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