Meu corpo esta precisando de férias

Hoje de manhã levantei cansado. Cansado de segurar a barra só, de contar as novidades, de comprar um vinho e convidar os amigos e dizer que tudo está tudo bem. Cansado de ser forte.

Dormi nu. Tirei as roupas e as máscaras junto, mas precisei recolocá-las pela manhã: uma calça meio surrada, um sapato confortável e um disfarce de gente feliz – feliz o tempo inteiro. Gente que tem a obrigação de ser agradável.

Passei a pensar demais sobre o mundo. Isso é meio arriscado porque a gente acaba enxergando demais – e, uma vez desvendados os nossos próprios absurdos, não se pode voltar atrás. Talvez a ignorância seja mesmo uma bênção – não se dar conta da crueldade com que eventualmente o mundo é capaz de nos tratar. E vendo que amanheceu ensolarado, a certeza: está nublado por aqui.

Acordei meio cansado das minhas próprias escolhas. Só por hoje eu não quero decidir absolutamente nada – açúcar ou adoçante, bossa, rock’n roll ou sertanejo, bom dia ou foda-se?

Não quero ser compreendido. É só mais uma obrigação que dá muito trabalho. Só por hoje, não vou me esforçar pra ser educado e amado. Que nada seja dito ou pensado ao meu respeito: hoje só me cabe existir.

Acordei meio perdido em meio aos tabloides, às pessoas, à confusão urbana que se confunde estranhamente com a minha própria confusão. Não vou escolher uma playlist: toquem o que quiserem. Não vou pensar sobre as pessoas: sejam exatamente o que quiserem. Hoje, só por hoje, não quero conclusões.

Quero passar despercebido, como numa capa mágica de invisibilidade. Quero quase não existir até conseguir me ajustar a esse medo de ser eternamente desajustado. Não quero deadlines ou compromissos ou sorrisos ou explicações. Só por hoje quero coexistir passivamente e sem qualquer resquício de indignação. Meu corpo esta precisando de férias.

Jova
Enviado por Jova em 18/07/2017
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