COMO AVALIAR?

Lá ia Dulce com carinha de bons ares, transparecendo seu jeito de quem não sabe se vai, ou se foi, quando deparou com uma tenda na praça, anunciando em chamativos letreiros, a venda dos famosos Carnês do Tatu. Assim que o experiente vendedor lhe pousou os olhos, percebeu que iria faturar e derramou sua lábia:

- Minha jovem, hoje é o dia em que terá a chance de ganhar uma casa em nossa promoção especial! É uma grande oportunidade, venha testar a sorte!

Dulce se interessou porque já assistira, pela televisão, algumas pessoas sendo premiadas com o referido carnê. Assim recebeu do vendedor sorrisos, incentivo, esclarecimentos e o desafio:

- Você tem talão de cheques?

Ela tinha.

- Então pegue e segure com fé. Agora verifique o número no campo superior esquerdo, se for igual a este..., você ganha!

Era igual.

Aplaudindo com entusiasmo o homem a parabenizava. Faltava apenas tornar-se uma cliente adquirindo dez carnês, pagando ali as primeiras prestações, e após a quitação completa deles, ao final de alguns meses, poderia receber o imóvel.

Dulce foi depressa ao encontro do irmão, com a bolsa recheada de talões e estourando de alegria, lhe contou tudo o que acontecera.

O rapaz quase teve uma síncope, sabendo que a irmã pouco se interessava por assuntos bancários, explicou que aquele número, era o código de compensação, igual em todos os cheques daquele banco na região.

Imediatamente voltou com a irmã até a praça e agarrando o trapaceiro pelo colarinho, com a delicadeza de uma betoneira, colocou os pingos nos is:

- Você sabe bem com quem mexe, não é mesmo? Então devolva o que ela lhe pagou antes que eu te entorte a cara e chame a polícia.

O sujeito acostumado com essa situação restituiu o dinheiro e escorregadio, alegando ter sido tudo um engano por parte da moça, se livrou da surra, mas não do desabamento de sua barraca.

Antes de devolver os carnês, Dulce olhou bem para eles e perguntou:

- Mano, posso comprar pelo menos dois?

Neste caso real, a adorável Dulce continua portando uma legítima ingenuidade, não se preocupa em observar a malícia nos outros porque a maldade não existe nela. Algumas vezes é enganada, mas, conta certamente com muitos anjos a lhe proteger, esteja onde estiver.

Confesso não conseguir avaliar a necessidade de uma mudança em seu modo de ser, pois não é esta pureza de sentimentos, o ideal para todos alcançarmos? Não sei qual é a sua opinião, mas, se fôssemos assim, a polícia e até os anjos, poderiam ser dispensados.