Um Dia Inesquecível

Entre sonhos e ilusões, lá estava eu em uma manhã de sexta-feira, recapitulando a ótima semana que passara, exceto pelo fato de estar muito cansada devido ao meu trabalho complicado e exaustivo. Ligado sem mera coincidência a redigir milhares de relatórios e, no final, acabar sem uma gratificação adequada, que atingisse um reconhecimento como profissional, causava-me receio por saber qual seria o resultado final.

Estava sentada agora, neste exato momento, na calçada cinza e cheia de marcas amarronzadas deixadas ali por consequência do mau tempo que fizera há dois dias atrás. Em frente à minha casa esperava apenas minha amiga Laura chegar no seu Porsche vermelho, luxuoso e coberto de lama, para irmos juntas ao trabalho, como sempre fizéramos desde os velhos tempos.

De repente ouço o choro ininterrupto de uma garotinha que andava desesperadamente. Eu não sabia ao certo qual era a ambição daquela pobre criança, até o momento que sua voz soou como uma sirene em combustão, gritando e clamando por sua mãe. Ela corria em minha direção agora. Sem pensar, meus braços juntaram-se num movimento voluntário ao redor de seu corpo, o que me fez ver um medo assustador naquele rosto indefeso.

Estar ali me deixara aflita e inquieta, enquanto havia uma incrível sensação de desespero, todas as dificuldades e pesadelos que, por mais que tentasse expulsá-los, sabia que jamais iriam embora de minha memória. A infância pobre, coberta por rejeição e desconsolo, faziam de mim uma pessoa frágil, mas também repleta de forças para construir um futuro e uma carreira brilhantes, superando os próprios limites e fazendo pelos outros o que, sinceramente, nunca fora nem sequer planejado a mim.

Fechei os olhos e tentei preencher a mente com pensamentos que levassem aquelas lágrimas para longe de meu rosto. Um pouco impossível seria essa, sem dúvida, uma missão para não desabar em um turbilhão de emoções. Permanecer ali, com lembranças afagando a memória e vendo uma simples previa de mim nos olhos aquosos e ansiosos daquela menininha, me fez ter uma pequena viagem para o complexo interior da mente.

Quando nos distanciamos, Clara que, até a pouco soluçava sem parar, contou-me seu nome e que se perdera de sua mãe enquanto andavam em meio a uma multidão de pessoas na rua. Ajudei-a a acalmar-se, insistindo em uma maneira na qual tudo ficaria bem. Prestando mais atenção, percebi uma mochila que Clara levava nas costas. Rapidamente vasculhei-a sem ao menos pedir permissão. Com grande êxito encontrei uma agenda com a identificação da criança e também telefones de seus responsáveis.

Quando sua mãe, após receber minha ligação, chegou até onde estávamos ficou muito agradecida. Não tinha palavras, estava em estado de choque e o que mais sabia fazer no momento era abraçar Clara e falar sem parar o quanto a amava.

Tudo ficou bem e eu me senti realizada por fazer o bem a alguém. Às vezes pergunto-me qual é a verdadeira missão de cada um, outras vezes espero a certeza de que tudo um dia realmente possa ser visto de uma maneira inocente e angelical, como os olhos de uma criança, imaginando um luminoso lugar ao céu para encontrar a paz e ser feliz. Tendo a certeza de que Clara estava em segurança, na proteção de sua mãe, me despedi delas e voltei à rotina do dia.

Ao anoitecer quando retornei de volta para casa, terminando mais um dia de trabalho cheio de novas experiências, parei no portão e fiquei admirando os carros passarem pela rua.

Assim que a chuva caiu lentamente sobre minha pele, pude sentir um brilho intenso dentro de mim, não sabia direito o que estava acontecendo, minha alma ardia em chamas, um calor que glorificava até mesmo a última gota de esperança que havia no mundo. Enquanto fitava a adorável beleza de tudo o que nos rodeia, maravilhosamente bem pelo dia que me fora oportunizado, servindo de amparo àquele pequeno ser, lembro da criança desprotegida que segurei em meus braços, consolando sua agonia e seu medo por estar sozinha.

Pego minha bolsa e entro, sentindo-me feliz e com muita paz no coração, afinal não é sempre que Deus nos consagra uma oportunidade como esta. O que vale é ver a vida com um olhar perspectivo, aproveitando cada segundo, cada simples detalhe que ensina a aprender com erros e acertos e, com isso, tornando-se pessoas melhores.