CÍRIO DE NAZARÉ

Morei com minha família na Av. Nazaré, ao lado do Ed. Manoel Pinto da Silva, em frente à Praça da República, em Belém do Pará, desde que tinha 10 anos de idade. E lá meus pais morreram, ambos com 90 anos, de modo que eu tive oportunidade de assistir ao Círio e ver a passagem da Santa por mais de 50 anos.

Era impressionante sentir a fé e a emoção das pessoas, com lágrimas nos olhos, quando a Berlinda com a pequena imagem, ornada com flores coloridas, passava diante delas. Todos, absolutamente todos, independentemente de idade, raça e sexo, ficavam literalmente fascinados pela pequenina Santa.

Disse que, a partir de 10 anos, morei na Av. Nazaré e assistia o Círio. Faltei com parte da verdade. Realmente morei a partir dos 10 anos, mas a casa, antes de pertencer a meus pais, já pertencia aos meus tios desde o meu nascimento e a intimidade com a maior manifestação de fé do Brasil dura toda a minha vida.

Por longos anos acompanhei a Trasladação agradecendo a Deus que, pela intercessão da Virgem, guiou os conselhos da pediatra e permitiu que os procedimentos tivessem surtido efeito e que meu filho, Almir Jr., tenha sido curado de Púrpura. Depois de inúmeros tratamentos suas plaquetas voltaram ao normal e desde então eu e minha primeira esposa acompanhávamos a Trasladação, ao lado da Berlinda, desde o Largo de Nazaré até a Praça da Sé. Acho que ela havia feito promessa, mas eu de fato ia mais para agradecer a cura do meu filho e toda a felicidade que havia tido na vida, e ainda tenho, inclusive as dificuldades que me surgiram e continuam a aparecer e que tenho a felicidade de poder contornar.

Explicando melhor, confesso que não sou muito afeito a promessas. Peço, quando necessito, e agradeço sempre, independente de promessas. Perdoe-me quem acha diferente, mas, pra mim, pagar promessa, mal comparado, “cheira” a pagar resgate de sequestro. Diz-se à Santa: vou fazer tal e tal coisa, mas..., somente se a graça for alcançada. As boas ações deverão ser feitas independentemente de condições. Pode-se dizer que é apenas questão de semântica, contudo, tenho certeza que, mesmo os que se dizem pagadores de promessas, na realidade estão agradecendo, com a fé de que suas necessidades foram alcançadas, por intercessão de Nossa Senhora de Nazaré junto a Deus.

Assim, tendo vivido o entendimento do sofrimento do aperto passado, quase sem espaço para mexer os pés, no acompanhamento da procissão, junto a Berlinda, sem que isso fosse desagradável, e tendo visto e sentido por tantos anos a emoção dos romeiros ao chegarem perto da imagem, tentei fazer uma música que traduzisse por sua letra e por sua melodia a parte nostálgica que arrancava lágrimas, mixada com a amálgama de formas e cores dos objetos levados nas cabeças dos peregrinos, das maquetes de casas, dos tijolos, das frutas, dos brinquedos de miriti, dos moldes em cera de cabeças, pés, braços, mãos, carregados no afã de agradecer e mostrar a todos a graça alcançada.

Fiz uma ladainha iniciando a música e pedi ao meu filho Almir Jr. Que musicasse o restante da letra num ritmo de carimbó. Saiu assim:

CÍRIO DE NAZARÉ

(Almir Morisson e Almir Júnior)

Gente chorando, olhando a berlinda.

Gente na corda sofrendo com fé

Povo passando alegre, cantando:

Senhora de Nazaré!

Manhã de domingo de outubro

É gente é mais que milhão

Romeiros, Belém, pé no chão

É cobra, é rio, é procissão.

Pecador, caminho de fé

É papel picado, são fogos balões.

É Círio de Nazaré

Caminha lenta a multidão

Cabeças de gente, de casas, de cruz.

São frutas tijolos lembrando Jesus

Caboclo chegando lá do interior

Com tanta promessa é bom pagador

De cera são círios, são pés, braços, mãos.

São barcos, bonecos mostrando o artesão.

A corda, a berlinda, e o povo

Descalço, pedindo perdão.

Tive oportunidade de mostrar, em show apresentado no ano 2000, a música, cantada por meus dois filhos Almir Junior e Alcyr Neto. O público gostou muito.

Assistam e digam se concordam:

https://www.youtube.com/watch?v=iH3hWPGYGxA

No ano de 2012 tive que fazer uma operação de retirada da tireoide por causa dos nove nódulos que apareceram. Apesar da biópsia não atestar malignidade meus médicos acharam que o procedimento deveria ser cirúrgico, pois os nódulos cresciam muito rapidamente. E lá fui eu pra cirurgia.

Já havíamos marcado um show do Clube do Camelo no segundo semestre e atualmente os cantores do clube são o Firmino, o Tobias e eu. Acontece que houve um trauma cirúrgico no nervo que controla as cordas vocais e a prega vocal direita ficou paralisada, impedindo que a voz, no canto, fosse produzida como antigamente.

Combinamos que minha participação no show seria como compositor, mostrando a mesma música referente ao Círio, cantada do mesmo modo que em 2000, pelos meus dois filhos, só que agora enriquecida pela participação de minha atual esposa Mônica e de minhas filhas Monique e Aline no “backing vocal”.

Seria uma oportunidade de agradecer à Virgem de Nazaré pela benignidade de meus nódulos de tireoide e pedir pela recuperação do movimento em minha corda vocal direita.

Por outras razões, um dos meus filhos teve que viajar para São Luis do Maranhão, no dia do show, e o outro, mais tímido, acredito que não teve coragem de cantar sozinho.

Assim, resolvi cantar eu mesmo, apesar de ainda nem saber se iria conseguir me recuperar da paralisia nas cordas vocais. Afinal estava mostrando o compositor e não o cantor. Minha esposa e filhas ajudaram no back e o público (na maioria amigos) aplaudiu.

Em dezembro fiz nova videolaringoscopia que atestou a recuperação total dos movimentos das cordas vocais. Os médicos disseram que não tinha havido paralisia e somente uma paresia, portanto temporária, problema resolvido com os exercícios da Dra. Claudia, minha fonoaudióloga.

Mas, que no meio de tudo isso teve o dedo de Nossa Senhora de Nazaré, aí teve...

A apresentação da musica no show de 2000 pode ser escutada em:

http://www.recantodasletras.com.br/audios/cancoes/73438

Usei tanbém como fundo de um vídeo que produzi em homenagem ao Círio, Assistam e vejam se gostam:

https://www.youtube.com/watch?v=iH3hWPGYGxA