histórias da vila - reforma agraria

Histórias da vila

Fim dos anos oitenta, o país ainda sob os efeitos do movimento das diretas já, temos um cenário onde são criados novos partidos, outros saindo da clandestinidade e todos com uma necessidade enorme de arregimentar militantes, correligionários e afins. Bem, dentro deste clima nos vemos na capital das Gerais, propriamente em uma vila situada às margens do Ribeirão Arrudas, a Vila Ambrosina. Uma vila pacata, já com seus barracos de alvenarias, seus becos ainda precários com esgotos a céu aberto e composta por moradores humildes, trabalhadores, honestos e com grande vontade de vencer, trazendo dentro de si a esperanças de dias melhores, a violência ali ainda não existia, a não ser quando havia alguma desavença de cachaça ou briga de marido e mulher, e ninguém metia a colher,prevalecia o ditado. Estávamos todos ali envolvidos na criação de uma associação que representassem as nossas reivindicações e posições junto aos órgãos e repartições publicas do município e do estado oficial, e tínhamos como parceiros de caminhada e de luta a Pastoral da terra da Igreja Católica, que fazia junto a comunidade um trabalho de conscientização e despertamento sobre as necessidades de luta para as conquistas de terras para reforma agrária, e eu nunca entendi porque? Ninguém ali tinha intenção de plantar, não havia espaço para isto, por se tratar de uma favela, a não ser pelas titularização dos barracos, bem isto não importa agora, vamos aos fatos, este pessoal provocava varias palestras, reuniões, encontros, debates, uma verdadeira lavagem cerebral nas cabeças daquelas pessoas que estavam ali, não entendia nada más mesmo assim demonstravam muita vontade em ajudar naquela luta proposta. E em meio a este pessoal tinha uma mulher negra, já nas casas dos seus cinquenta, respeitada, posição firme , a voz de referencia daquele lugar, melhor dizendo a Mãe de todos e que vou dar um nome fictício de Maria. Pois bem estava D. Maria em seu barraco, ali pelas volta das três horas da tarde, quando em sua porta alguém bate, era Samuel (nome fictício), também na mesma faixa de idade e muito amigo da D Maria, já meio chumbado com umas cachaças na cabeça e com muita revolta dentro de si, dirigindo a ela disse: Maria, quanto tempo você me conhece, você sabe o tanto que trabalho para dar sustento à minha família (mentira, só vivia pelos botecos e a muito não trabalhava) o tanto que cuido deles, e ela de lá, sei, sim hum, ta bão, sem dar muita atenção, e ele continuou a choradeira, você acredita que cheguei para almoçar e não encontrei nada pronto, nem um arroz com ovo a minha mulher fez para min, veja bem nem um arroz com ovo, foi quando ele percebendo aquela situação, disse, poxa, estou aqui a me desabafar, esperando uma palavra amiga e você dizendo hum hum, tá bao, isto não se faz, esperava mais de você, foi quando ela do alto da sua simplicidade, colocou a mão em seu ombro e disse Samuel, depois que inventaram esta tal de reforma agrária, mulher nenhuma quer ir para fogão mais não, acabou.

Esta era a D. Maria.

Charles Vagner
Enviado por Charles Vagner em 07/12/2016
Reeditado em 10/12/2016
Código do texto: T5846762
Classificação de conteúdo: seguro