SOTERRADO NAS INCERTEZAS

Aí então o tempo passa. Aquele tal livro já escrevemos, e tal árvore já plantamos. O livro está meio amarelado e a árvore, bem, nem tinha me dado conta, era um eucalipto, foi arrancado para fazer moirões. Já apodreceram.

Ah, os filhos! Já os tivemos e eles estão criados. Agora então parece que a obra está pronta, já fizemos as três coisas que se espera de um vivente normal. Aprendemos isto na filosofia de botequim.

Dei-me conta que a maioria de nós segue uma cartilha que nem sabemos quem foi o estrupício que a escreveu.

Será que é só isso? E a parte do vivente como fica?

Não sorria homem, você não está sendo filmado, você foi enganado o tempo todo! E tudo começou lá, quando a parteira te bateu na bunda e te chacoalhou. Você tomou o gostinho do ar e chorou. É meu amigo, era para você entender que neste mundo é só dureza. A partir de então foi só engodo. De cara o mundo te mostra um rol de coisas que pode e que não pode fazer.

Tu ficas perdido diante de tantas normas. Quando é criança então! A lista de tarefas sem nexo é imensa e não há espaço para democracia ou liberdade de expressão. Sempre com a retórica de que é para o nosso bem. É duro ser criança. Quando já adolescente, vamos à forra. Aí sim o bicho pega! Não fica pedra sobre pedra para o desespero deles, os pais ditadores.

Quando nos tornamos pais, bate uma amnésia e fazemos tudo igual aos nossos pais, de novo, e ainda mentimos para os nossos filhos dizendo que os seus avós eram piores.

E agora José? Dá uma vontade de chutar o pau da barraca, mas não, fomos treinados para seguir a maldita cartilha. O de sermos estudados e bem sucedidos na vida.

Fomos enganados por algum capitalista de que o trabalho enobrece e nem nobre ficamos. Ficamos apenas cansados e gastos, e ele, o capitalista, mais rico ficou.

Fomos para a inatividade e descobrimos que ele (o patrão)nos enganou o tempo todo, e recorremos à justiça para recuperar o dinheiro que não nos foi pago corretamente. Mergulhamos num mundo de ações trabalhistas. Tentamos recuperar a paga pelo trabalho quando em trabalho estivemos e isto também dá um trabalho danado.

Tentamos recuperar o tempo que achamos perdidos, apenas ilusão. O tempo que passou é como as flechas atiradas, não têm retorno.

Mesmo assim vamos iludindo-nos.

Agora com uma nova cartilha, a derradeira, e está escrito na capa: “Manual da Terceira Idade”. Tenha santa paciência! Devemos ir aqui e ali; devemos fazer isto ou aquilo; devemos comer tal coisa para ter saúde; devemos passar um creme aqui e ali; devemos tomar tal remédio para ficar jovem, etc. Ninguém merece!

É hora de chutar o balde! A contagem regressiva começou. (está na cartilha)

Diante de tudo que passamos, ainda continuamos soterrados pelas incertezas e, só por isso, constatamos que as cartilhas as quais obedecemos durante nossa fugaz existência, estavam erradas!

Agora nos deslumbramos a cada por do Sol e agradecemos por um novo amanhecer.

As cartilhas, nós rasgamos. Está na hora de escrever a nossa própria.

Ainda dá tempo.