Esmolas de Sabedoria

A lanterna traseira do carro à minha frente me encara; com peculiares olhos escarlates, olha-me como quem me julga, desnudando-me o corpo e a alma. A cada frenagem, brilham-me vermelhos de fúria, sedentos de sangue.

Ao meu lado, passam lojas e restaurantes com suas parafernálias de marketing a reluzir pela luz do sol. São vultos de letras e números, misturando-se em uma sopa de persuasão.

Pela calçada, as pessoas vêm e vão, algumas como quem vai para o trabalho, outras como quem vai para a diversão; olhando pra frente, pro celular, pro chão; como formigas-robôs seguem seus caminhos, vivendo em suas bolhas de sabão. Mas ali, bem no meio da calçada, dentre a loucura da cidade, meus olhos encontram alguém com algum resquício de lucidez... Um mendigo. Sentado na frente de uma das dezenas de lojas - que, provavelmente, nunca pôde entrar - observa o ambiente à sua volta como quem compreende as injustiças, e as futilidades de um mundo doentio; um toque de sensatez em meio à alienação das formigas-robôs.

À minha frente, os peculiares olhos escarlates ainda me penetram, mas dessa vez, não só com fúria; pois aquele olhar reflete em meu cérebro, onde ecoam acusações.