Éramos tão amigos

Éramos amigos, tão amigos que talvez fizéssemos parte de um universo tão nosso e tão particular que tornávamos-nos um pouco de cada um. Não nos faltava assunto, bastava o cotidiano para que estivéssemos confortáveis com a nossa presença. Falávamos de música, de amores, outras amizade, de nós e dos outros. Falávamos de tudo. E havíamos acreditado que o mundo já não era tão duro, pois que o enfrentaríamos juntos. Estabelecemos encontros semanais, almoços, lanches, o que a semana permitisse, e, sob o confortável prazer de sermos quem éramos e quem queríamos ser, aproximávamos cada vez mais. E mais. Até não nos aproximarmos mais. Até pularmos uma semana pois que estava tudo tão difícil. Apressados, não tínhamos tempo. Até não compartilharmos mais um detalhe que, como diria o poeta, sustentava o edifício inteiro. E, com a inversa euforia que havíamos nos conhecido, nos desconhecemos. De forma tão singela que, quando percebemos, já era tarde demais. Já havíamos preenchido a vida com outras vidas, a rotina com outros rotineiros, e as longas conversas transformaram-se em tímidas mensagens de texto. Fato é que já não sabíamos quem éramos, arrisco dizer que já nem nos interessávamos mais. E, aos poucos, como tudo que enche nosso coração, aquela amizade se desmanchou em linhas que já não pareciam ser costuráveis. Mas tínhamos um ao outro. O compromisso agora eram essas tímidas mensagens, que jamais deixariam de ser respondidas. Estavam presas no eventualmente e não no urgente, eram uma forma de afirmar que, apesar de tudo, estávamos ali. Mas, como? Caso precisasse, faria de tudo, pois que um, dia, aquele amigo foi indispensável e, por esse dia, o torno inesquecível.

Fernanda Marinho Antunes
Enviado por Fernanda Marinho Antunes em 04/09/2016
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