Joaquim

Um homem simples com quem me deparei hoje num momento de volta para casa. Um trabalhador, ajudante de pedreiro, com muitas histórias pra contar da sua vida, dos filhos, ex mulher e a felicidade de ir para Minas. Senti vontade de eternizá-lo, mas como fazer? Escrevo.

A felicidade está em momentos assim, de simplicidade extrema, que vem de gente simples depois de um ano duro de trabalho pesado. Joaquim, era amigo de infância e eu nem sabia, melhor, nem lembrava. Mas ele lembrou de mim.

Raros são os momentos da vida, em que sua vida volta atrás, mas hoje isso aconteceu. Foi muio bom conversar com alguém que vem de onde vim e poder compartilhar, mesmo por alguns minutos, o que aconteceu na vida de cada um. A melhor coisa que me aconteceu foi parar um pouco, descer um pouco ao chão e olhar nos olhos cansados, arredios e machucados de Joaquim. Ele não se chama Joaquim, mas como não me recordo o nome, lhe presentei com esse, singelo e que cabe bem ao personagem.

Sim, voltei no tempo. No tempo da escola, das séries iniciais, mas especificamente da 2ª série em que eu anarquizei a escola, mas, mesmo assim, tiveram muita paciência e isso foi mais uma vez muita sorte minha. De fato, tudo que passou foi projeção da minha realidade, e voltando a esse lugar percebo que nunca nos separamos, o chão daqui está ligado a mim e eu a ele como o corpo está ligado ao coração, se nos separamos há uma morte consequente. Voltei a escola, voltei as amigas e amigos, voltei a mim. Nesse momento relembrando a conversa que tive com Joaquim, me emociono ao lembrar das situações que naquele época nos era engraçado, e hoje nem tanto. Estudávamos numa zona rural, onde o ônibus tinha que nos carregar uns mais de 500 km para chegarmos e nunca sabíamos o resultado dessa viagem. Um dia, choveu tanto que tivemos que descer do ônibus pois o mesmo ficou atolado na lama, e teve um dia também que foi pior, nesse dia tivemos medo. O dito ônibus ficou preso numa ribanceira e pensamos que íamos todos morrer. A morte naquele lugar nos perseguia, agora me recordo de um dia que entrou um escorpião na sala de aula e ficamos assustados, a professora mais ainda.

É muito tocante chegar num dia como hoje e voltar nesses momentos. Alguns colegas já morreram e essa parte da conversa foi meio triste, e confesso que mesmo isso tendo ocorrido há muitos anos, sinto falta deles. Quero eternizá-los aqui também.

É difícil falar de coisas do passado pois elas doem, mesmo quando você já esqueceu delas há algum tempo.

Bom, cada um teve um destino diferente, maioria casou, descasou, foi trabalhar, criar os filhos. O importante ao ver os olhos daquele homem hoje, é que me surpreendo com minha própria realidade. Eu tinha tudo pra “dar errado” no sentido social mesmo, mas alguma coisa lá no fundo me manteve até aqui. Não sei explicar direito, mas sei que esse algo pode ser chamado de literatura ou de respiração, fôlego.

Joaquim desceu do ônibus, desejou boas festas e foi embora. Estava feliz por que ia ver os filhos e estava levando presentes. Contou que faz bicos, mas não fica “parado”.

Sua simplicidade, seu amor aos filhos e a grandeza de um homem simples e operário, o fazem ser um herói. A esse herói, dedico estas linhas.

Andressa Takao
Enviado por Andressa Takao em 23/12/2015
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