"PELO FIM DOS PRIVILÉGIOS PARA DEFICIENTES"

O que uma vaga de carro pode causar em algumas pessoas? Um grupo em Curitiba parece ter a resposta:

"Redução em 50% das vagas exclusivas para deficientes;

Fim das cotas para deficientes em empresas;

Redução em 50% de filas e assentos exclusivos para deficientes;

Pelo fim da isenção de impostos na compra de carro zero;

Pelo fim das cotas em concurso público;

Pelo fim à gratuidade para deficientes."

Mas o "Movimento Pela Reforma de Direitos" - na sua linha de raciocínio - esqueceu de completar sua lista de direitos, como: fim do benefício da previdência social de aposentadoria; fim das vagas de carro reservadas para idosos; fim da criminalização do preconceito racial; etc.

Pois bem, colocar uma chave no buraco da fechadura e destranca-la, ou, no contato do carro e liga-lo; apertar a maçaneta e gira-la no sentido anti-horário e puxar ou empurrar a porta; engatar a primeira e acelerar o carro; são práticas simples do cotidiano; imagine porém que para cada uma dessas práticas sejam excluídas pessoas não capazes de realizar, como: as que não tem força na mão, ter braço quebrado, não ter braço, artrite reumatoide ou cistos. Para atravessar a rua, de calçada à calçada, seriam excluídas outras tantas: sem perna, coxos, idosos, claudicantes, deficientes, crianças de colo... nesses dois exemplos, é provável que todos nós já tenhamos passado por uma incapacidade, dificuldade ou, (disability) deficiência. Quando uma dificuldade se impõe a nós, nos tornamos deficientes, como, caminhar com pés inchados, manusear teclados com artrite, subir escadas com artrose, trabalhar no escritório com enxaqueca aguda, manter-se sentado tendo hérnia de disco... são todas, formas de dificuldade menos visíveis, mas nem por isso deixam de ser deficiências.

Só passamos a ver o absurdo nas ruas, quando olhamos de dentro para fora: buracos na calçada, falta de rampas de acesso, ausência de corrimãos, pouquíssimos pisos tátil direcional e de alerta, falta de elevadores... ou seja, em grande parte, o mundo é feito para pessoas sem problemas biológicos; não estamos preparados para contemplar a diversidade dos corpos, haja vista que muito pouco é pensado do ponto de vista de quem sofre por suas particularidades físicas; nossa percepção de "normais" impede de ver aquilo que está na cara. Ou seja, a lesão (impairments) é o que define o problema da pessoa, seja físico ou mental, e a definição de deficiência (disability) é a forma como a sociedade acolhe a pessoa lesionada; sendo assim, é fácil dizer que uma enxaqueca ou ressaca são lesões que as impedem de ser autônomas, mesmo temporariamente, tornando-as deficientes. Somos deficientes diversas vezes em nossa vida. É fácil dizer também, que um cego em São Paulo é muito mais deficiente do que um cego na cidade de Praga, ou, um cadeirante no Brasil em geral, é mais deficiente do que um cadeirante em Seattle. A deficiência aumenta na exata proporção em que a sociedade não está apta à contempla-la.

Sendo assim, o "Movimento pela reforma dos direitos" propôs o fim das cotas para deficientes em empresas, essa minoria desempregada e sem a isenção de impostos para compra de carro zero acarretaria numa queda gradativa de compras de automóveis, pois também não teriam emprego para comprar o carro adaptado, estes, que por sua vez ocupariam cada dia menos vagas em ruas e estacionamentos, cada dia menos espaço pelas calçadas, metrôs, ônibus, escolas, ou qualquer espaço público/privado; teríamos um país separado das pessoas diferentes, assim como o nazismo segregou judeus, como segregamos haitianos, como a Europa segrega refugiados sírios e muçulmanos.

Por fim, e com muito entusiasmo, o "Movimento pela reforma dos direitos" foi apenas uma ação publicitária do Conselho Municipal das Pessoas com Deficiência da Cidade de Curitiba, chamando a atenção, de forma legítima, para um problema social que é a presença de direitos destes no Brasil. Chamando a atenção para um debate lógico e coerente de políticas públicas mais agregadoras. E, celebramos nesse "Dia Internacional da Pessoa com Deficiência Física" 03/12/2015, que tenhamos cada vez mais consciência e respeito para com nossos iguais.