Sobre a felicidade

Dias atrás, ouvi um conhecido dizer que planeja a felicidade. Bom, não preciso nem dizer que eu fiquei com todas as pulgas (que não tenho) atrás da minha orelha! Onde já se viu planejar a felicidade? E afinal, que raio é essa tal de felicidade? Ser feliz implica em quê, pelo amor de Deus? Não que eu não soubesse o que é ser feliz, mas resolvi buscar as definições formais.

Li em alguns dicionários a definição de felicidade, e, resumindo, pro Pai dos Burros, "felicidade" é a característica ou condição de "feliz", ou seja, a sensação real de satisfação plena, um estado de contentamento, de quem se encontra afortunado - aliás, pra quem não sabe, dizer que alguém é "afortunado", é a mesma coisa que dizer que ele é sortudo ou que está com sorte. Por incrível que pareça, o pai deste conceito, é Nicolau Maquiavel, o cara que escreveu o consagradíssimo livro "O Príncipe", em 1513 -; felicidade e bem-aventurança são sinônimos, e indicam um estado tanto da alma quanto do espírito.

Retomando o cara da vida superestimada e superplanejada, fiquei pensando em quantas pessoas vivem de planejar a felicidade. Parei pra refletir até se eu, cri-cri que sou, não estava planejando muito mais do que sendo. Pensei em quantos "bom dia" a gente economiza e quantas rugas aparecem no nosso rosto por conta das preocupações que a gente adquire por querer, só porque decidiu que vai traçar a própria felicidade. Pensei aliás, na quantidade absurda de amor que a gente desperdiça enquanto planeja amar. Concluí que somos todos estúpidos. OI? SIM! "Porque nem sempre".

De alguma forma, em algum lugar do percurso, a gente perdeu o fio da meada. Planos são importantes, sim, E MUITO! Mas inclusive no que tange o nosso estado de espírito? Nós deveríamos ser internados em hospícios cada vez que cogitamos uma insanidade desse porte ridículo. Tudo bem, a vida não é fácil, e tem todas as crises econômicas ao redor do mundo, tem os cortes de despesas em grandes empresas, tem a escola do seu filho que você tem que pagar todo mês, tem o valor do combustível que é um absurdo, tem aquela viagem que você ainda não fez, tem a casa que você quer comprar, tem aquele probleminha com a sua sogra que você precisa resolver, tem a conta do cartão de crédito, tem a conta de água, tem a tv à cabo e tem, inclusive, aquelas coisas que você sente até um comichão de vontade de comprar e ainda não comprou porque tem outras prioridades. E eu também sei que você precisa dividir o seu tempo pra conseguir dar atenção pra sua namorada e pros seus amigos, sem se esquecer, é claro da sua família; Tem o intercâmbio que você quer fazer, e tem aquele curso daquele idioma específico, que você precisa saber falar fluentemente, pra ontem. Tem os impostos, tem as parcelas dos mil seguros, e tem, é lógico, a sua conta no happy-hour daquele barzinho charmoso da sua cidade, porque você não é de ferro. Assim como eu sei que tudo o que eu citei, precisa de planejamento. E eu sei que tudo o que eu citei, quando é alcançado com êxito, deixa a vida mais leve, deixa a gente um pouquinho mais feliz, sim. Mas eu acho que a felicidade vai além disso tudo. E quando eu digo que ela vai além, eu me refiro ao nível suprassumo chamado de "simples", que a maioria das pessoas adultas é incapaz de compreender, porque a realidade social - independente de classe - às vezes pesa. E quando não é a realidade social que pesa, a realidade em si, trata de pesar umas mil vezes mais. E às vezes a realidade decide tirar o dia pra se chamar SEGUNDA-FEIRA... aí vai tudo por água à baixo, porque afinal de contas, tem todas as coisas pelas quais as pessoas se arrepiam da cabeça aos pés, e tem a odiada segunda-feira.

A verdade é que a gente encara a existência como um peso, e se esquece de encará-la como a bênção que ela é. A gente esquece de trocar as lentes, a gente esquece que o pessimismo é uma carga desnecessária... a verdade é que a gente esquece de decidir "apesar de". A gente esquece de ter fé em Deus, a gente esquece de ter fé nas pessoas, a gente esquece de ter fé na vida e de ver coragem no amor! E às vezes, é tanto problema que a gente esquece de perceber o quão bonita a vida é, apesar da realidade caótica que a sociedade apresenta. "Apesar de". A gente esquece da leveza, e tem dia que parece que a gente simplesmente quer enfiar o dedo com tudo na ferida, só pra ficar mais down. E tem dia que a gente fala sem parar, enche dez quilos de linguiça, só pra falar que a felicidade não é algo que se planeja...

Assim que o cara da vida superestimada disse que vive planejando a própria felicidade, fiz questão de perguntar se ele não planejava a vida, para, consequentemente, ser feliz. E ele me respondeu que não. Ele me respondeu que organiza os seus dias por "estressado", "triste", "bravo", "empolgado" e "feliz". Mas eu convivo com aquele olhar vazio e infeliz, de quem não tem coragem de viver a vida. Eu sei que ele planeja a felicidade pra sexta-feira, mas deixa ela passar sábado, domingo, segunda, terça, quarta e quinta, e quando chega a sexta, ele não é feliz coisa nenhuma. Eu convivo com aquele olhar de quem tanto planejou ser feliz, que acabou se esqueceu do mais óbvio, que é SER feliz. O fato, é que a felicidade é como o amor: ambos partem de uma decisão nossa, e não de um planejamento prévio, tão bem planejado que tem até firma reconhecida em cartório. Decide-se amar, bem como decide-se ser feliz. Decidir dar o primeiro passo é encher os pulmões de coragem, e decidir assumir cada querer que a gente tem na vida, é dar as mãos pra intrepidez, é assumir um risco incrivelmente empolgante. A felicidade acontece feito o amor: por acaso. E o acaso é um presente pra quem decide permitir-se presentear!

Então não importa se é segunda-feira, ou se é sexta: ao invés de temperar a vida com apenas uma pitadinha de amor, joga logo o pote todo só pra ver como adoça o dia-a-dia! Não importa o peso caótico da realidade, importa que a felicidade é uma questão de ser, e não de planejar. A felicidade é feito o amor, e onde já se viu querer fazer tudo planejado? O amor é fruto do acaso, do caso não pensado, do desencontro encontrado, do reencontro reencontrado, no meio da rua, na porta da faculdade, no centro da cidade, no meio do rio, na rede social, dentro de um escritório, no meio do shopping, no parque ecológico, dentro de uma igreja, nas salas de embarque e desembarque de qualquer aeroporto... o amor anda de mãos dadas com a coragem e faz piada da paixão planejada, e a paixão planejada, hora morre de tédio, e outrora morre de medo de medo também. E assim é a felicidade: ela faz piada da tal felicidade planejada, com hora e data marcada, que não se permite ser leve feito o vento, livre feito um pássaro, doce feito primeiro amor, e bonita feito o super espetáculo natural que é o nascer-do-Sol. A felicidade é exatamente como Jeneci define: só questão de ser.

Você vai perceber que a essência deste incrível estado de espírito, não se encontra naquilo que você possui materialmente. Mas depende de quão bem cuidado está o seu jardim emocional.

E felicidade, leitor, é o que eu te desejo. Da mais genuína, da mais pura, da mais gostosa, da mais reconfortante, feito uma taça de Carménère chileno/uruguaio/francês em um dia frio. Desejo que a felicidade seja para você, leve feito pena, e te faça leve e livre também. Porque Deus te fez pra ser feliz. Feliz de verdade. Deus te fez pra ser!

* Este texto foi escrito em 14/01/2014.

Débora Cervelatti Oliveira
Enviado por Débora Cervelatti Oliveira em 14/10/2015
Código do texto: T5414245
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