Violência cotidiana - Socos, chutes e gravatas

Fim de semana triste. Bem triste. Imagens de arrastões esbofetearam a minha face incrédula. Enquanto eu corria pela Lagoa, apreciava a beleza do Rio de Janeiro como cartão-postal, depois soube que nesse mesmo instante aconteciam arrastões nas praias. Vários ataques e atos de violência. Uns quebraram uma loja em algum lugar, senão me engano era Humaitá, outros promoviam arrastões no Arpoador e invadiram ônibus. Enfim, um caos total.

Hoje, antes de dormir, ainda vi um outro vídeo (antes tinha visto um de menores roubando as bicicletas das pessoas e os seus pertences - arrastões de 30, 40 pessoas). No novo vídeo, a imagem de um ladrão-menor - de bermuda, descalço e sem camisa - correndo para fugir, tentando entrar num ônibus. A população o pega e taca a porrada. Socos, chutes e gravatas. Pessoas gritam: "Isso, mete a porrada, arrebenta, mata".

Depois de socá-lo, um homem empurra-o. O ladrão está meio desnorteado. Outro cara vai atrás dele e lhe dá mais socos. O ladrão se desvencilha e corre no meio dos carros e todos o xingam.

Estamos vivendo um terror constante. Um estágio de barbárie, onde a população, sem crença nas leis e acuada, tenta fazer justiça com as próprias mãos. Uns dizem: "Tem que matar essa pivetada". E isso, na verdade, é um reflexo do país como trem descarrilhado. Não é o Rio de Janeiro. É o Brasil.

Estamos sentados em cima de um barril de pólvora. "Não sabemos de onde vem o tiro". Estamos engatilhados com toda fúria, motivados pelo descaso e abandono. País do samba, sambando na corda bamba. Todos querem o linchamento em praça pública. Já não somos ignorantes do sangue nas calçadas. Ou o sangue é nosso ou é fruto de nossos punhos cerrados que socaram mais um "bandidinho". Todos nós amolamos a faca do menor que ataca pra roubar uma bike ou o último lançamento do iPhone. Corremos, fugimos, espancamos, somos mortos, levamos tiros, somos roubados por pivetes e políticos. Somos uma nação em pedaços. Uma nação cabisbaixa, juntando os estilhaços da vidraça da nossa vergonha.

Sim, tivemos um fim de semana de terror. Fomos espancados em nosso orgulho. Fomos violentados em nossa cidadania. Mas ainda cantamos: "Se a vida começasse agora/ se o mundo fosse nosso de vez/ E a gente não parasse mais de cantar, de se dar, de viver...".

Que consigamos calar os acordes dissonantes dos disparos e dos gritos de terror. Que sejamos, um dia, amparados em nossa dor. E que voltemos a ser felizes, pois estamos alimentando a energia do desânimo, da população que todo dia é espancada, não só fisicamente, mas moralmente, o que é pior. E isso não é discurso de partido. É um discurso de um cidadão, porque a minha humanidade está cansada de ser espancada diariamente.

Estamos rezando, acreditando na proteção divina, porque do jeito que está, o que nos resta é abaixar a queixo pra salvar o nariz!!!

Raul Franco
Enviado por Raul Franco em 21/09/2015
Código do texto: T5389677
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