Algo para além de si mesma

Andava cansada e ultimamente vinha pensando demais em desistir, mesmo sabendo que aquela jamais seria a solução mais inteligente ou a melhor saída. Na verdade, sentia como se não existissem saídas, quaisquer que fossem. Sentia que tudo era maior e mais pesado do que poderia suportar, porque tudo, absolutamente tudo, sem distinção de classe ou grau, ou lugar qualquer que fosse, dentro ou fora de si, acabaria, redundantemente, sempre dando no mesmo lugar. Sentiu o descompasso da vida e de seu coração com pesar. Sentiu que a cada novo dia se despia das antigas esperanças, uma a uma, e as novas não vinham para tomar para si aquele lugar, que por direito adquirido ou não deveria a elas pertencer. Simplesmente não vinham e ela ficava ali em meio a uma pilha cada vez maior de desilusões desorganizadas, feito livros velhos e empoeirados uns sobre os outros, num canto esquecido qualquer. Livros que ninguém mais deseja ler.

Olhou para si mesma. Não no espelho ou em alguma fotografia recém tirada. Olhou para sua alma através de pensamentos que não podia calar e sentimentos que desejavam gritar. Sentiu dor e sentiu pena de si mesma. Uma pena que na realidade se estendia a todas as outras pessoas do mundo, que se quer se davam conta das vidas mesquinhas e medíocres que levavam, buscando sempre mais, por não se darem conta de que nada podiam para além de suas próprias limitações e que nada preencheria aquele lugar vazio e inóspito que ocupava seus corações. Mas, com certeza, sentiu mais pena de si mesma que sabia daquelas coisas do que de todos os outros que eram alheios a elas. Preferia não saber. Preferia mesmo. Preferia ser feliz, como as pessoas comuns pareciam ser. Preferia ser medíocre, mesmo porque era o que na verdade era. Mas preferia ser uma dessas pessoas medíocres e felizes, que acham graça na vida e encontram entusiasmo no ato de coragem que é viver. Pessoas que realmente acham importante competir e vencer na vida e ser alguma coisa "importante", mesmo que seja só porque ouviram dizer que é assim que tem que ser.

Gostaria de apenas ser, porque é assim que tem que ser. E não ter dúvidas ou inquietações como aquelas lhe obrigando a conviver com a consciência de que algo para além de si mesma sempre estava a faltar. Algo do qual ela não tinha controle ou conhecimento real, mas que caso ela pudesse saber de fato o que era poderia dar a toda sua vida um sentido que lhe faltava. Um sentido maior talvez... uma alegria de viver que não encontrava; uma ousadia em libertar-se da tentativa de entender da qual se privava; uma coragem de apenas ser sem saber, que não se permitia. Enfim, uma sensação de ser completa e feliz que desconhecia.

MAMagni
Enviado por MAMagni em 08/09/2015
Reeditado em 09/09/2015
Código do texto: T5375283
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