A #partidA começou!

Durante a 2ª reunião da #partidA, que ocorreu em São Paulo, no último dia 14, uma das falas que mais me chamou a atenção foi a da garota que, ao se apresentar, enfatizou que não gostaria de estar num lugar em que “precisaria se explicar”.

Em meio a uma crise – quiçá uma das piores – de representação sociopolítica no Brasil, juntamente com a dificuldade de acreditar em novas formas de fazer política, faz-se necessário explicar a #partidA, sobretudo do ponto de vista da convocação à reflexão política. Estamos bem cansadxs do formato vertical, autoritário, fundamentalista e ultraconservador com que os políticos tradicionais, em especial aqueles que exercem o governo no Brasil, em um modelo determinado pelo patriarcado, têm conduzido o país.

Tendo em vista que o conceito do partido político está, literal e estruturalmente p-a-r-t-i-d-o, a #partidA emerge de uma provocação. E provoca porque não é partido – com a terminação “o”, nem se assemelha ao formato que esse representa. O que faz a #‎partidA não se encaixar em quaisquer termo reducionista ou definitivo é o fato de, por essência, ser um movimentx, em constante superação, que acolhe e é acolhidx por todxs àquelxs que são tratadxs como seres inessenciais, que não deveriam existir. A(o)s invisibilizada(o)s – uma vez que se trata de uma construção social – a proposta é de dar voz e libertar, trazê-los à política como protagonistas de um processo que visa pavimentar uma sociedade radicalmente fraterna, na qual as diversas formas de opressão acabem substituídas por um modelo que preze a igualdade, mas que assegure e respeite as diferenças.

A #partidA é também um ato de transgressão. Um movimento que adota a forma de um partido, em meio à crise da democracia participativa. Um ato de acolhimento e amor, em tempos de ódio. Um partido complexo, um feminismo dialógico, em uma época marcada por simplificações, binarismos e incapacidades para o diálogo.

A insatisfação e a inadequação que incita a existência – e insistência – da #partidA também se intensifica quando passamos a pensar numa sociedade, cujo regime político se afirma, no plano formal, democrático, mas os direitos e garantias fundamentais de amplas parcelas da sociedade não foram concretizados; quando a Chefe de Estado é uma mulher e, dos 39 ministérios, apenas 6 são conduzidos por mulheres. Isso em um quadro no qual mulheres votam contra o interesse de mulheres, naturalizam a violência obstetrícia, desqualificam outras mulheres, defendem a criminalização do aborto e não conseguem se libertar da ideologia patriarcal, a qual introjetaram desse sistema.

A #partidA revela-se uma necessidade ao perceber que, em um recente protesto, uma mulher ostentou um cartaz, escrito: “Feminicídio, sim! fomenicídio, não”. Isso na mesma quadra histórica em que as estatísticas apontam para cerca de 43 mil assassinatos de mulheres no Brasil (2000-2010) – este mesmo Feminicídio, que a senhora estampa no cartaz, ao pedir o impeachment da presidentA.

Ao mesmo tempo em que a #‎partidA critica o sistema hierarquizado de dominação masculina representado pelos “homens-brancos-cisgênero”, ela surge quase como uma utopia, porque o processo de construção é horizontal. É criado, pensado e surge à partir do diálogo. Muito diálogo. A #partidA não rechaça, não aponta o dedo, nem avilta, acolhe. É democrática por excelência. É feminista porque todas – inclusive aquelxs que não se declaram como mulher – sabem e reconhecem o papel de seres subalternizados e secundarizados historicamente. E por ser feminista democrática, a #‎partidA abarca os seres inessenciais (todo o resto, que não entra na normatividade: não serve ao opressor, mas à libertação de todas as formas de opressão): índios, negros, gays, trans, mulheres e outrxs mais que não se enquadram em qualquer papel “digno“ no modelo estigmatizante patriarcal. A #partidA surge para romper com o processo de “etiquetamento” e ódio em vigor na sociedade brasileira.

A #partidA não é uma aventura em busca de poder para “poucxs”. É fruto de um longo processo de luta que sempre foi protagonizado pelas mulheres, sem o qual, hoje, não existiram as condições objetivas à transformação do poder opressivo patriarcal em poder compreensivo libertador, sempre a partir da ético-política feminista. São as mulheres – sujeitxs de uma revolução (que deu certo!) – que estão legitimadas a convocar para o resgate da política, a instigar novas lutas, a ensinar e a transformar o imaginário patriarcal que tanta violência e dor ainda produz.

Em meio a tantos feminismos, todos com potencial de ensinar e aprender com os demais, e sem a pretensão autoritária de dizer qual é o melhor feminismo para o Brasil, a #partidA se propõe a acolher a todos eles em torno de um “comum”: a radical destruição do modelo patriarcal e de suas práticas, em sua maioria opressivas, como são também as práticas que levam à dominação de classe, racial e de padrões ditatoriais de normalidade.

No campo das lutas políticas, a fragmentação das potências que miram na libertação da opressão, com a criação artificial – e ideológica – de distâncias entre aliados que sofrem de diversas maneiras, mas sempre em razão de um mesmo modelo de dominação, que reserva privilégios para alguns, sempre foi a estratégia para manter as diversas formas de dominação. É hora de dar a #partidA para um luta que una identidade e classe, negrxs e brancxs, mulheres cis e trans, gays, lésbicas e heterossexuais, bem como todxs aqueles que sofrem em razão das mais variadas formas de dominação, que tem como modelo a dominação patriarcal.

A #partidA já começou. É de todxs, inclusive daqueles que nem sabem que dela necessitam.

Bruna Malaquias

Bruna Malaquias
Enviado por Elias Júnior Lima em 21/06/2015
Código do texto: T5284937
Classificação de conteúdo: seguro