ESTE É O TRABALHO DELES


Há certas coisas nessa vida que a gente pensa que nunca vão acontecer conosco. Mas acontecem. E aconteceu hoje.
No trabalho, concentrada no que tinha a ser feito, o celular tocou. Olhei e vi que era número privado. Não costumo atender, mas a curiosidade falou mais alto. Geralmente, (mania que tenho) não digo ‘alô’, ou ‘oi’, assim que atendo. Gosto, primeiramente, de ouvir algo do outro lado, um som qualquer que identifique se é a mocinha do telemarketing, ou mesmo, uma respiração que seja. Mania mesmo. E ouvi.
Antes de dizer alô, ouvi um barulho que me pareceu ser de talheres e uma voz ao fundo. De imediato percebi que a pessoa ao telefone, do outro lado, não estava sozinha.
Depois de alguns segundos eu disse:
- Alô.
A pessoa do outro lado com voz feminina, ou tentando imitar uma voz feminina, disse:
- Mãe !?
Para ganhar tempo, e ouvir novamente a voz, fingi que não havia escutado e disse outra vez:
- Alô ??
A ‘mocinha’ do outro lado, chorando:
- Ô Mãeee!
Já fiquei cabreira. Eu não tenho filha. Tenho filhos. Dois rapazes. Ambos casados e morando distantes.
Dando corda, eu disse:
- Pode falar, filha.
Ela chorando:
- Mãe, eu fui assaltada, mãe! Levaram todo meu dinheiro!
Fiquei estarrecida. Sabia que estava falando com um marginal. Um marginal tentando me aplicar o famoso golpe do assalto ou do sequestro, cada vez mais corriqueiro. Golpe que, segundo a polícia e as secretarias de segurança dos estados, podem ser efetuados de qualquer lugar, até de dentro de um presídio, por presos ou facções criminosas.
A princípio fiquei paralisada, sem reação, trêmula. Depois, num misto de raiva e indignação, eu respondi, ironicamente:
- Ah, é mesmo? Não me diga! Mas que coisa, heim!!
Do outro lado a voz deixou de ser feminina e me disse antes de desligar:
- Vai se f... piranha sem vergonha.

Pois é. Não deu certo comigo. Fiquei pensando depois se ele conseguiu aplicar esse golpe hoje a tarde em outra pessoa. Se não, vai ter que pegar firme amanhã novamente para poder ‘ganhar algum’. Esse é o ‘trabalho’ deles.

Para eles foi apenas mais um dia de trabalho. Quanto a mim, uma tarde perdida e uma noite pela frente tentando dormir.






 
Suzana França
Enviado por Suzana França em 12/06/2015
Reeditado em 12/06/2015
Código do texto: T5275334
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