Meu pedaço de paraíso

Li num livro que o quarto de uma pessoa mostra o que ela é, e eu até que concordo com isso porque um quarto é o espaço pessoal mais íntimo que qualquer ser humano pode ter. A minha casa é um ovo. Moro com meus pais e um casal de irmãos mais novos. Nós cinco dividimos um espaço pequeno, e ainda bem, graças a Deus, que todos somos bem pequenininhos. Apesar de ter meus dois irmãos, pelo menos o meu quarto é só meu e da Fia, a minha “gatinha” de estimação (“gatinha” entre aspas porque ela é bem gorda então não é tão pequena assim). Meu quarto é o maior cômodo da nossa casinha, e acho que é bem por isso que minha mãe sempre inventa de colocar coisas lá, e ela faz isso alegando que eu “quase nem fico em casa mesmo”. O problema é que quando eu estou em casa, aquele mundaréu de coisas atrapalha um pouco a minha própria confusão do meu quarto.

A princípio, a porta do meu quarto é de madeira, pintada à tinta óleo cinza. Logo a esquerda da entrada tem o guarda-roupa da minha irmã, que na verdade, abriga as roupas do meu irmão e como está no meu quarto, utilizei todas as prateleiras do meio do guarda-roupa para colocar meus livros didáticos, minhas revistas, e os livros de ficção e alguns teóricos também. Tenho um porta canetas com várias canetas que nem são utilizadas, estão ali eu nem sei o porquê, meu líquido para lentes de contato, e um ioiô, que assim que eu terminar de escrever vai pra fora daqui porque só o vi agora. Em cima do guarda-roupa tem mais livros, dezenas deles soltos, e umas três caixas de papelão com mais dezenas de outros livros. Sabe, eu tenho mania de comprar livros, e sou a única da família a ser assim. Bom, agora a minha mãe está ficando assim, pois comecei a presenteá-la com livros. No início ela fazia caras e bocas, porque sempre achava que abriria o pacote de presente e ganharia algo como roupas, utensílios domésticos ou cosméticos, mas não: era um livro. Até que lá pelo quarto ou quinto livro, ela começou a gostar, e agora ostenta uma prateleira cheia deles no quarto dela também, e até tem comprado livros sozinha depois que descobriu o Sebo do centro da cidade.

Na parede que fica em frente a porta do quarto tem a janela que dá para o quintal da casa e consequentemente, para a rua. Bem na frente do muro da casa, do lado de fora, tem uma árvore que meu avô plantou há quase trinta e cinco anos, e ela continua florescendo e seus galhos ficam no campo de visão da minha janela. Sempre gosto de admirá-la, especialmente quando chove, é maravilhoso ver as gotículas de água caindo sobre essa árvore, e ela parece sorrir pra mim cada vez que passo um tempo admirando-a. Foi o melhor presente que meu avô poderia ter me dado, mesmo que involuntariamente. Ele já se foi há onze anos, e eu permaneço com essa lembrança dele florescendo dia após dia na janela do meu quarto. Já fotografei, já escrevi sobre ela, já tentei descrever a sensação que tenho, a emoção que sinto por aquela árvore vista da janela do meu quarto, porém não é a mesma coisa que estar ao pé dela, admirando-a de um ângulo que só faz sentido a mim... Enfim, retomando a descrição do quarto: a janela é de vidro e tem um black out, o qual eu utilizo somente nas noites de sábado para domingo e assim a claridade não me acorda logo no raiar do dia.

Ao lado direito da janela tem o meu guarda-roupa. Ele é grande, alto e bem espaçoso, com as portas de correr. Na primeira repartição dele, de cima para baixo, tem as minhas caixas de sapatos de salto, são ao todo uns quinze pares. Um pouco abaixo tem todas as minhas jaquetas penduradas, e mais uma caixa enorme com mais um monte de pares de calçados, mas são os rasteiros e de verão. Acho que toda mulher tem essas piras de separar as coisas por estação, não é? Na repartição do meio, também tenho alguns livros, entre eles os meus títulos preferidos do Sidney Sheldon, escritor este que eu particularmente adoro, tenho Ítalo Calvino, um livro de entrevista que eu comprei só porque tinha uma entrevista com o Chomsky, e um dicionário de expressões em latim, de capa dura que é o meu xodó e que, sortudamente, encontrei na promoção por ter sido o último exemplar da livraria. Próximo a estes livros tem um porta retrato da gatinha Marie com a foto da minha prima, uma caixa de cartas e coisas das minhas amizades do tempo da escola e uma escrivaninha de madeira em miniatura feita à mão, que eu comprei em uma viagem que fiz no início deste ano. Logo abaixo tenho meus perfumes, meus cosméticos, acessórios e um gato preto de pelúcia que na verdade, o rabo dele é um porta-anéis. Mais abaixo tem os cobertores, um outro gato de pelúcia e meu Garfield de pelúcia que está entre os meus personagens favoritos, obviamente por ser um felino. A última repartição do guarda-roupa está, obviamente, lotado de roupas, isso sem contar também as três gavetas que tem na parte de baixo do guarda-roupa que também estão “explodindo de roupa”, como minha mãe costuma dizer. Parei de comprar roupas há uns três meses, só pra deixar claro.

Logo após o guarda-roupa tenho um espelho na parede, deve medir 1,20x0,8m aproximadamente. Esse espelho está comigo desde que entrei na adolescência e começaram a aparecer “meus primeiros raios de mulher”. Jamais saio de dentro do quarto usando algo que meu espelho tenha me mostrado que está estranho, eu confio plenamente nele e espero que ele realmente seja bem sincero comigo.

Finalmente, este é o meu quarto. O fato mais curioso sobre ele, e consequentemente sobre mim, como você até já deve ter notado, é que eu não tenho cama. Eu durmo em um colchão no chão, e isso mostra que eu sou bem versátil e um tanto adaptável ao meio, não me importo com luxo, o mais importante é que vivo aqui, este é o meu mundo e eu me sinto bem com ele e vivendo nele. Tem uma música que eu gosto e me identifico muito que diz o seguinte: “Eu gosto do meu quarto, do meu desarrumado, ninguém sabe mexer na minha confusão. É o meu ponto de vista, não aceito turistas, meu mundo está fechado pra visitação...”.

Este é o meu pedaço de paraíso, é o meu abrigo, meu porto seguro, minha pista de dança, meu divã, meu consolo, meu escritório ou é o que eu imaginar que ele é, esta é a magia entre os quartos e seus donos.

Alucy
Enviado por Alucy em 24/05/2015
Código do texto: T5252885
Classificação de conteúdo: seguro