O INEXPLICÁVEL, IMPOSSÍVEL E INVISÍVEL...

Durante a Idade Média, a Igreja Católica Apostólica Romana perseguiu, torturou, e, queimou em fogueiras, hereges, judeus, ciganos. Durante a Segunda Guerra Mundial, os nazistas perseguiram, torturaram, e eliminaram sistematicamente, em seus campos de concentração, ciganos, judeus. Século XXI, Brasil, pastores evangélicos (em sua grande maioria neopentecostais), e que desobedecendo a laicidade que a Constituição prevê, os pastores que também são políticos (deputados e senadores) resolveram proibir sacrifícios de animais em rituais religiosos. Algo que é milenar para religiões como judaísmo, islamismo, hinduísmo, religiões de matrizes africanas (como o candomblé, e, principalmente, ele; numa perseguição religiosa).

Falamos aqui de religiões milenares: candomblé foi criado aqui no Brasil da união de várias crenças africanas em Deuses e Deusas específicos de cada povo, nação ou tribo. Tem por volta de 10 mil anos. Hinduísmo tem por volta de 4000 a 6000 anos A.C., Judaísmo tem por volta de quase 5800 anos, Islamismo tem por volta de quase 1450 anos.

São religiões tribais, de vários povos e etnias. Exemplo: as doze tribos de Israel (patriarcais) originadas dos doze filhos de Jacó, neto de Abraão. São elas: Rúben, Simeão, Levi, Judá, Zebulom, Issacar, Dã, Gade, Aser, Naftali, Benjamin, Manassés e Efraim. Com a extinção do Reino de Israel ao norte, as dez tribos desapareceriam exiladas por Sancheriv rei Assírio. As outras tribos restantes (Judá, Benjamim e Levi constituiriam o que hoje se chama de judeus e serviria de base para sua divisão comunitária (Yisrael, Levi e Cohen). Povos africanos: nação Ketu, dos iorubás, que cultua Orixás; nação Efon, que também cultua Orixás; nação Angola, do povo Bantu, que cultua Inquices (Nkisi’s); nação Jeje, dos povos Fon, Fanti, Ewe, Ashanti e Mina, que cultuam os Voduns.

É costume de religiões primordiais, milenares e, portanto, tribais, o sacrifício de animais para seus Deuses: não importando se religião politeísta ou monoteísta. Os costumem se mantiveram, a tradição se manteve, passando de geração em geração.

Judeus tem todo um código em seu livro denominado “Levítico” que discorre sobre que tipo de vestimenta usar, como se vestir, higienizar, o que comer ou deixar de comer, sobre sexo, herança, e, sobre sacrifícios de animais (com detalhes de quais animais serão sacrificados, para que intuito específico, e características físicas deles e idade, além de sexo do animal e dia de sacrifício).

Querer proibir estes sacrifícios é querer proibir uma manifestação cultural - de povos e civilizações inteiras -, proibir a História deles de perpetuar para as gerações futuras, um extermínio antropológico e sociológico que dizima crenças e costumes. Tais costumes podem ser vistos como errados nos dias atuais, ainda mais por uma sociedade ocidental e cristã. Judaísmo, Islamismo e Hinduísmo parecem orientais demais aos nossos olhos (e, leia-se orientais como sinônimo de primitivos e atrasados).

O preconceito é mais exacerbado pelo detalhe que, se judeus sacrificam seus animais para Jeová ou Javé é algo divino, pois é para seu Deus monoteísta; se islâmicos sacrificam seus animais para Alá, também é visto como algo divino, porque é para seu Deus monoteísta; se hindus sacrificam seus animais para seus vários Deuses e Deusas - apesar de ser visto com olhos atravessados - ainda, não tem o mesmo caráter preconceituoso que o sacrifício de animais de uma religião negra que cultua Deuses e Deusas negros. Parte-se da lógica que se a religião é de negros e os sacrifícios são para seus Deuses Negros (vistos como primitivos, inferiores), certamente, são para algum efeito maléfico, relacionado a algo demoníaco, certamente, uma plêiade de demônios relacionados ao Diabo, a Lúcifer, o “Anjo Decaído”.

O que não se apercebe é que também há o mesmo sacrifício no Cristianismo (mesmo que de uma forma mais subliminar, mais disfarçada e sublimada metaforicamente). Jesus é o “Cristo”, ele é o “Cordeiro Imolado”, ou seja, o cordeiro sacrificado. Novamente, remonta-se ao sacrifício de animais, feito pelos povos judaicos - Abraão sacrificaria seu filho Isaac a pedido de Javé, mas no momento iminente, um Anjo de Deus o impediu e o guiou até um carneiro que foi sacrificado no lugar de seu filho -, e outros exemplos tirados do “Levítico”. Jesus sendo o “Cordeiro Imolado/Sacrificado” tem a mesma conotação ideológica do sacrifício de um animal a Deus. Ele, ao invés, ao ser sacrificado, substitui todos os outros sacrifícios de quaisquer espécies de animais que pudessem se suceder. Seu sacrifico redime toda a Humanidade é algo de caráter perpétuo – não é necessário sacrificar-se mais nenhum animal porque seu auto sacrifício possui uma carga tão poderosa e transmutadora que nenhum outro nunca mais será exigido e nem preciso. Em outras palavras, Ele é o sacrífico substitutivo eterno, que durará até o Dia do Julgamento Final. Mas, por analogia, assim como a carne e sangue de animais (neste caso, do carneiro a ser imolado), Ele teve sua carne e corpo imolados sublimados metaforicamente e sendo substituídos pelo pão e seu sangue imolado também sendo metaforicamente sublimado e substituído por vinho. Apesar de ser uma imolação das partes cheia de conotação metafórica, na qual se sublimou algo físico, animal por alimentos substitutivos, a essência mantém-se. Jesus, o “Cristo” foi sacrificado ao Deus Único, Onipresente e Onisciente que é Ele-Mesmo na figura una-trina da Trindade Sagrada (Deus-Pai – Javé/Jeová, Deus- Filho – o próprio Jesus, “O Cristo” e Deus Espírito Santo).

O sacrifício de animais no candomblé tem caráter rápido e indolor. O importante é o sacrifício e não a dor incutida no animal ou ato de tortura. Tal sacrifício difere do que ocorre em abatedouros de bovinos, suínos, caprinos ou aves que muitas vezes são verdadeiros rituais de tortura com requintes de crueldade. Sem contar que, matar para comer e gerar lucro capitalista para fazendeiros e donos de frigoríficos, pode e é moralmente aceitável. Já o sacrifício para fins religiosos é algo condenável, ainda mais se for para Deuses e Deusas negros, que tem identificação popular com demônios.

Isto é hipocrisia: todos são sacrifícios para Deus, para algo Cósmico, Divino e Indecifrável, não importando a cor deste Deus e posição geográfica.

No candomblé o animal é sacrificado para o Orixá, e separa-se o que é ofertado a ele e o que é dividido para a comunidade religiosa (tribo, aldeia) como alimento ungido da respectiva festa, celebração.

Várias civilizações já extintas sacrificavam animais: sumérios assírios, persas, babilônios, egípcios, gregos, romanos, celtas/druidas, bárbaros/vikings, nórdicos etc. O costume apenas se tornou algo em desuso, se formos analisar nos dias atuais, pois restaram poucas religiões milenares, tribais e primordiais. Uma civilização dominou e dizimou a outra, todas as da Mesopotâmia, e, depois gregos sendo dominados por romanos que foram substituídos por cristãos que dizimaram com seus Deuses Politeístas. Se não houvesse este ato de subjugar e dizimar civilizações diferentes, (se houvesse uma coexistência harmoniosa entre elas), talvez, e, muito provavelmente, sacrifício de animais poderia ser, hoje em dia, algo encarado como moral e rotineiro.

Falar de sacrifício de animais é falar de “Magia” em sua essência. Há elementos mágicos, que tem poder de transmutação, poder alquímico. Alguns deles: os famosos cinco elementos (fogo, terra, ar, água, éter), as pedras / a rocha / os minerais, os vegetais / as plantas / as ervas sagradas específicas, o óleo e, por fim, o sangue. Tudo isto é alquímico.

Explicarei sobre o candomblé que é minha crença e tenho maior embasamento para discutir. Cada Orixá/Inquice/Vodun tem suas pedras mágicas, suas ervas sagradas específicas e seus animais de sacrifício. Tudo isto é baseado nas lendas diversas da vasta Mitologia Africana. Baseando-se nelas, pode-se dizer quais animais sacrificar e quais são interditos, tabus – aqueles que são quizilas e proibidos – para cada Deus e Deusa. Ele é sacrificado, partes específicas de seus corpos são ofertadas em gamelas, as vísceras são descartadas e o restante serve de alimento para toda a comunidade comer em comunhão, numa celebração coletiva da comunidade tribal. Sangue é energia vital na sua mais pura essência, tem força mágica poderosa. Usar do sacrifício do animal para obter seu sangue e ofertá-lo a determinado Deus parte da premissa alquímica de: “uma vida por outra vida”. Nada tem a ver com sacrificar o animal para fazer mal a alguém; tirar-lhe o emprego, o/a cônjuge; pô-lo doente ou até matá-lo. Em verdade, é justamente o oposto, uma contrapartida em que se gera a vida, estabelece-se a cura para as enfermidades. O animal (e seu sangue) sacrificado substitui a vida da pessoa que está enferma e pode vir a morrer. Seu imolamento livra a pessoa da doença, estabelece a cura, porém, uma vida tem de substituir a outra. Por isto, há esta troca de caráter transmutador e alquímico.

Todavia, falar destas práticas pode parecer primitivismo, instintos bárbaros aos olhos de quem não pertence à religião. Pode parecer loucura, crueldade ou, até mesmo, fanatismo. Mas isto é “Magia”, pura e simples, no seu sentido mais básico. Isto é crença!!! Isto é “Fé!!!” E, crer e ter ‘Fé’ é acreditar no Inexplicável, no Impossível e Invisível. Para crer e ter ‘Fé’ não é necessário ter provas científicas de sua existência. ‘Fé’ não se esquematiza, sistematiza, racionaliza. ‘Fé’ é inabalável. ‘Fé’ apenas se acredita, apenas se ‘sente’ e ‘vivencia’ com o Coração, com a Alma.

Frida Pascio Monteiro
Enviado por Frida Pascio Monteiro em 12/03/2015
Reeditado em 17/05/2015
Código do texto: T5167344
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